Foi publicado recentemente uma matéria no jornal New York Times sobre a construção do complexo hidroelétrico Belo Monte. A notícia tem início com a história de Raimunda Gomes da Silva, que se deslocou para Altamira devido à construção de outra obra semelhante. Essa senhora, segundo a matéria, vive agora um constante "déjà vu".
Na verdade, assim como ela, todos nós vivemos esse etérno "déjà vu". Quantas famílias já não foram deslocadas de suas casas, do lugar onde criaram os seus filhos e foram criados pelos seus pais, onde apreenderam os valores da vida? É claro que a submissão ao "interesse nacional" (que neste caso pode ser traduzido por "interesse das empresas", tendo em vista que a óbra representa um fracasso da engenharia humana), nunca teve um impacto tão direto e cruel na vida dos habitantes das grandes metrópoles, que podem continuar descansando em suas salas de estar, vendo o mundo a partir do vidro incolor de suas janelas. Nossa vida continua sem maiores abalos. Não perdemos e não ganhamos, pelos menos não imediatamente.
O problema é que essa "conta" será cobrada no futuro para nós e no presente para as pessoas diretamente afetadas pela construção de Belo Monte. Talvez seja por isso que o habitante "classe média" das grandes metrópoles não consiga se comover com a situação dos índios e ribeirinhos que terão suas vidas alteradas e dilaceradas pela imposição da ganância e do descaso dos grandes empresários e seus interesses econômicos. Será a vida deles que nunca mais será a mesma. O peixe do dia a dia... O rio que deixa sua marca na paisagem, onde outrora e hoje ainda vivem os antepassados, terá seu fluxo alterado para sempre, inundando não somente a terra, mas a memória dos seus habitantes. A vida deles é que está em jogo. A nossa já foi perdida há muito tempo... Já não sabemos o significado de viver no mundo desde que trocamos as grandes paisagens da natureza pelo ambiete artificial dos shopping centers... Estar no mundo, imersão-revelação dos que vivem conectados com seu meu ambiente é para nós uma memória antiga... Trocamos há muito tempo atrás a vida na natureza pela existência virtual dos grandes complexos urbanos, com sua violência visual, auditiva... E agora queremos transformar a vida de Raimunda da mesma forma que outrora a vida dos nossos antepassados foi transformada pela força da "economia". Essa "economia de humanidade" que transformou a natureza em um "objeto". Objeto que busca escapar da prisão e, desta forma, se torna uma ameaça a vida virtual?
A história se repete novamente. Não apreendemos com os exemplos passados, com as vidas e as paisagens alteradas, dilaceradas, corrompidas, interrompidas para sempre. Não apreendemos nada por que não vivemos! E é só por isso que assistimos ao autoritarismo de um Governo que acredita que o futuro da humanidade são as fábricas e o sonho capitalista. Estaremos diante de um marxismo pós-moderno?
Dona Raimunda sabe que a vida é feita de deslocamento. Quantas vezes antes os seus antepassados não tiveram que migrar devido à violência imposta pelos governos? Mas será que a terra irá se desdobrar para sempre no infinito dos tempos? Será que nós, habitantes das grandes cidades, teremos também a mesma capacidade de se deslocar no tempo e no espaço e recomeçar tudo de novo, do zero? Será que algum dia vamos conseguir nos libertar deste agora quase etérno escafandro virtual ao qual fomos submetidos? Talvez esse questionamento seja a chave que interliga a vida de Dona Raimunda com a nossa... Pena que estejámos tão desconectados para perceber os sinais do tempo...
Blog "Antropologia Simétrica" by Diego Soares is licensed under a Creative Commons Atribuição-Uso Não-Comercial-Compatilhamento pela mesma licença 3.0 Unported License.
Based on a work at www.antroposimetrica.blogspot.com.
terça-feira, 31 de agosto de 2010
segunda-feira, 30 de agosto de 2010
Site com Banco de Dados sobre projetos hidroelétrcos na Amazônia
Novo site traz informações sobre mais de 140 projetos hidroelétricos em construção ou em funcionamento na Amazônia.
O banco de dados on line do site "Dams in Amazon" traz informações sobre a dimensão dos projetos, as empresas envolvidas e os impactos no meio ambiente e nas populações indígenas e tradicionais.
Trata-se de mais uma contribuição no monitoramento dos impactos ambientais e sociais de obras como Belo Monte. Vale apena conferir no link abaixo!
Link: http://www.dams-info.org/en
O banco de dados on line do site "Dams in Amazon" traz informações sobre a dimensão dos projetos, as empresas envolvidas e os impactos no meio ambiente e nas populações indígenas e tradicionais.
Trata-se de mais uma contribuição no monitoramento dos impactos ambientais e sociais de obras como Belo Monte. Vale apena conferir no link abaixo!
Link: http://www.dams-info.org/en
Sobre a atual política indigenista do Governo Lula...
O antropólogo Eduardo Viveiros de Castro, um dos membros da equipe da candidata à presidência Marina Silva (PV), criticou a falta de articulação do governo Lula em relação à questão indígena no País.
"Certamente, o maior inimigo dos índios durante a gestão do governo Lula, não foi o governo Lula. Trata-se talvez da necessidade do governo compor, por razões da estrutura do governo, com forças que são inimigas mortais dos povos indígenas, como vimos no caso da Raposa Serra do Sol", afirmou em referência ao conflito entre indígenas e rizicultores em uma reserva em Roraima.
Viveiros de Castro também atacou a representação da Fundação Nacional do Índio (Funai) e criticou àqueles que a colocam na posição de "árbitro" da questão indigenista.
"É preciso entender que a Funai, o órgão responsável pela implementação da política indigenista, tem por obrigação defender os índios, não é um juiz, não é um árbitro. É um defensor da causa indígena (...) as pessoas entendem que a Funai deve pronunciar veredictos, quando, na verdade, a função dela é representar. Os índios devem cada vez mais constituir suas formas de representação dentro do Estado, junto do Estado. Mas um ponto fundamental é reforçar o dever constitucional do Estado brasileiro perante aos índios brasileiros".
O antropólogo ainda afirmou que o dever constitucional com os índios estaria cumprido se a sua representação fosse reforçada no Estado.
"A minha proposta é, como horizonte geral, o de dar tanto às populações indígenas quanto às populações tradicionais plena visibilidade política formal. Não sei como isso pode ser feito, mas temos dezenas de países perto de nós, como é o caso da Colômbia, que sugerem que há formas diferenciadas de relação das populações tradicionais com o Estado que vão um pouco mais adiante do que foi a enorme conquista da constituição de 88".
Questionado sobre se colocar um indígena para presidir a Funai resolveria o problema, ele pareceu cético.
"Não sei o que pensa a senadora, ou a equipe de campanha, mas não acho que seja uma solução mágica, não sei se é a melhor solução. Penso que talvez o interessante é que você tenha muitos presidentes indígenas de outras instâncias, outros corpos, entes políticos, administrativos, mas não na Funai. Acho até que pode ser contraproducente, em vista do processo de filtragem passiva que essas escolhas muitas vezes produzem".
Durante seu discurso, pronunciado na apresentação das novas diretrizes do plano de governo de Marina, Viveiros de Castro se concentrou em pontos como energias renováveis e modos de produção. "Uma política verdadeira precisa que as pessoas pensem. O papel é levantar o que poderosos tentam esconder (...) o Brasil precisa aprender a dar exemplos e não seguir, até por que não há mais exemplos para seguir", afirmou o antropólogo.
"Certamente, o maior inimigo dos índios durante a gestão do governo Lula, não foi o governo Lula. Trata-se talvez da necessidade do governo compor, por razões da estrutura do governo, com forças que são inimigas mortais dos povos indígenas, como vimos no caso da Raposa Serra do Sol", afirmou em referência ao conflito entre indígenas e rizicultores em uma reserva em Roraima.
Viveiros de Castro também atacou a representação da Fundação Nacional do Índio (Funai) e criticou àqueles que a colocam na posição de "árbitro" da questão indigenista.
"É preciso entender que a Funai, o órgão responsável pela implementação da política indigenista, tem por obrigação defender os índios, não é um juiz, não é um árbitro. É um defensor da causa indígena (...) as pessoas entendem que a Funai deve pronunciar veredictos, quando, na verdade, a função dela é representar. Os índios devem cada vez mais constituir suas formas de representação dentro do Estado, junto do Estado. Mas um ponto fundamental é reforçar o dever constitucional do Estado brasileiro perante aos índios brasileiros".
O antropólogo ainda afirmou que o dever constitucional com os índios estaria cumprido se a sua representação fosse reforçada no Estado.
"A minha proposta é, como horizonte geral, o de dar tanto às populações indígenas quanto às populações tradicionais plena visibilidade política formal. Não sei como isso pode ser feito, mas temos dezenas de países perto de nós, como é o caso da Colômbia, que sugerem que há formas diferenciadas de relação das populações tradicionais com o Estado que vão um pouco mais adiante do que foi a enorme conquista da constituição de 88".
Questionado sobre se colocar um indígena para presidir a Funai resolveria o problema, ele pareceu cético.
"Não sei o que pensa a senadora, ou a equipe de campanha, mas não acho que seja uma solução mágica, não sei se é a melhor solução. Penso que talvez o interessante é que você tenha muitos presidentes indígenas de outras instâncias, outros corpos, entes políticos, administrativos, mas não na Funai. Acho até que pode ser contraproducente, em vista do processo de filtragem passiva que essas escolhas muitas vezes produzem".
Durante seu discurso, pronunciado na apresentação das novas diretrizes do plano de governo de Marina, Viveiros de Castro se concentrou em pontos como energias renováveis e modos de produção. "Uma política verdadeira precisa que as pessoas pensem. O papel é levantar o que poderosos tentam esconder (...) o Brasil precisa aprender a dar exemplos e não seguir, até por que não há mais exemplos para seguir", afirmou o antropólogo.
Simpósio Internacional de Saberes Tradicionais, Biodiversidade, Biotecnologia e Dinâmicas Territoriais - SINBIOTEK
O Laboratório de Estudos e Pesquisas das Dinâmicas Territoriais - LABOTER - do Instituto de Estudos Sócio-ambientais (IESA) da Universidade Federal de Goiás (UFG), em parceria com o Institut de Recherche Pour le Dèveloppment - IRD (França) e Agence nacionale de la Recherche - ANR (França), realizarão no período de 3 a 5 de novembro de 2010 o Simpósio Internacional de Saberes Tradicionais, Biodiversidade, Biotecnologia e Dinâmicas Territoriais - SINBIOTEK, em Goiânia-GO / Brasil.
Estão abertas inscrições de trabalhos até o prazo de 20 de setembro de 2010.
Para mais informações acesse:
www.iesa.ufg.br/biotek (clicar no link do Simpósio).
Estão abertas inscrições de trabalhos até o prazo de 20 de setembro de 2010.
Para mais informações acesse:
www.iesa.ufg.br/biotek (clicar no link do Simpósio).
Amostra de Documentários - Povos Indígenas do Sul do Brasil
A Prefeitura de Porto Alegre está promovendo uma amostra de documentários sobre povos indígenas do sul do Brasil (Kaigang e Mbya-Guarani). O evento vai ocorrer nesta 3ª feira, dia 31 de agosto, na sala de cinema P. F. Gastal, no Centro Cultural Usina do Gasômetro.
Programação do evento:
“A mata é que mostra nossa comida / Kaingang / 30m”
“Os seres da mata e sua vida como pessoas / Mbyá-Guarani / 27m”
Projeto Documentário da Cultura Material dos Coletivos Indígenas na Bacia Hidrográfica do Lago Guaíba
Programação do evento:
“A mata é que mostra nossa comida / Kaingang / 30m”
“Os seres da mata e sua vida como pessoas / Mbyá-Guarani / 27m”
Projeto Documentário da Cultura Material dos Coletivos Indígenas na Bacia Hidrográfica do Lago Guaíba
sábado, 28 de agosto de 2010
Novidade! A Biblioteca "Antroposimetrica"
Resolvi seguir os conselhos de leitores do blog e amigos e abrir um "espaço público" para a disponibilização de artigos relacionados à temática da antropologia simétrica, incluindo textos de etnologia, antropologia da ciência e teoria antropológica. Os textos estão disponíveis na página "Biblioteca" (neste blog), basta clicar no link e baixar o arquivo do site "4shared.com". Depois disso é só saborear a leitura!
quinta-feira, 26 de agosto de 2010
Sobre Fractais (About Fractals)...
“The objects we study, the objects in which we are caught up, the objects we perform, are always more than one and less than many. (…) Which is why it is interesting to work with the metaphor of the fractal. (…) A fractal is a line which occupies more than one dimension but less than two. So a fractional object? Well, this is something is indeed more than one and less than many. Somewhere in between. With is difficult to think because it defies the simplicities of the single – but also the corresponding simplicities of pluralism of the laisez faire, of a single universe inhabited by separate objects”.
Fonte: John Law, 1999. “After ANT: complexity, naming and topology”. IN: Actor Network Theory and After.
“Fractals also make their appearance in Strathern’s texts. She comes with another fractal image: one that has to do with making parts out of a whole. Divide a thick line into two black stripes and a white stripe. So two-thirds of what you then have as your starting point is black, one third is white. Now divide each of the lines on your paper (or screen): the blacks into two black and one white line, the white into two white and one black line. And again. And again. The black and white lines get smaller and smaller. But however far you go, the amount of black and white remain the same. They only get more and more intimately included in each other. So here we have an image of a more and more ingrained mutual inclusion”
Fonte: Annemarie Mol, 2002. The Body Multiple: ontology in medical practice.
"A Geometry of Nature. The cantor dust. Begin with a line; remove the middle third; then remove the middle third of the remaining segments; and so on. The Cantor set is the dust of points that remain. They are infinitely many, but their total lenght is 0. The paradoxical qualities of such constructions disturbed nineteenth-century mathematicians, but Mandelbrot saw the Cantor set as a model for the occurence of errors in an eletronic transmission line. Engineers saw periods of error-free transmission, mixed with periods when errors would come in burst. Looked at more closely, the bursts, too, contained error-free period within them. And so on - it was an example of fractal time. At every time scale, from hours to seconds, Maldelbrot discovered that the relationship of errors to clean transmission remained constant. Such dusts, he contended, are indispensable in modeling intermittency"
Fonte: Marilyn Strathern. 2004. Partial Connections.
“Fractal is a rough or fragmented geometric shape that can be split into parts, each of which is (at least approximately) a reduced-size copy of the whole, a property called self-similarity. Roots of mathematically rigorous treatment of fractals can be traced back to functions studied by Karl Weierstrass, Georg Cantor and Felix Hausdorff in studying functions that were continuous but not differentiable; however, the term fractal was coined by Benoît Mandelbrot in 1975 and was derived from the Latin fractus meaning "broken" or "fractured." A mathematical fractal is based on an equation that undergoes iteration, a form of feedback based on recursion.
A fractal often has the following features:
• It has a fine structure at arbitrarily small scales.
• It is too irregular to be easily described in traditional Euclidean geometric language.
• It is self-similar (at least approximately or stochastically).
• It has a Hausdorff dimension which is greater than its topological dimension (although this requirement is not met by space-filling curves such as the Hilbert curve).[4]
• It has a simple and recursive definition.
Because they appear similar at all levels of magnification, fractals are often considered to be infinitely complex (in informal terms). Natural objects that are approximated by fractals to a degree include clouds, mountain ranges, lightning bolts, coastlines, snow flakes, various vegetables (cauliflower and broccoli), and animal coloration patterns. However, not all self-similar objects are fractals—for example, the real line (a straight Euclidean line) is formally self-similar but fails to have other fractal characteristics; for instance, it is regular enough to be described in Euclidean terms”.
Fonte: Wikipedia (USA)
“Fractais (do latim fractus, fração, quebrado) são figuras da geometria não-Euclidiana.
"A geometria fractal é o ramo da matemática que estuda as propriedades e comportamento dos fractais. Descreve muitas situações que não podem ser explicadas facilmente pela geometria clássica, e foram aplicadas em ciência, tecnologia e arte gerada por computador. As raízes conceituais dos fractais remontam a tentativas de medir o tamanho de objetos para os quais as definições tradicionais baseadas na geometria euclidiana falham.
Um fractal (anteriormente conhecido como curva monstro) é um objeto geométrico que pode ser dividido em partes, cada uma das quais semelhante ao objeto original. Diz-se que os fractais têm infinitos detalhes, são geralmente autossimilares e independem de escala. Em muitos casos um fractal pode ser gerado por um padrão repetido, tipicamente um processo recorrente ou iterativo.
O termo foi criado em 1975 por Benoît Mandelbrot, matemático francês nascido na Polónia, que descobriu a geometria fractal na década de 1970 do século XX, a partir do adjetivo latino fractus, do verbo frangere, que significa quebrar”.
Fonte: Wikipedia (Brasil)
Fonte: John Law, 1999. “After ANT: complexity, naming and topology”. IN: Actor Network Theory and After.
“Fractals also make their appearance in Strathern’s texts. She comes with another fractal image: one that has to do with making parts out of a whole. Divide a thick line into two black stripes and a white stripe. So two-thirds of what you then have as your starting point is black, one third is white. Now divide each of the lines on your paper (or screen): the blacks into two black and one white line, the white into two white and one black line. And again. And again. The black and white lines get smaller and smaller. But however far you go, the amount of black and white remain the same. They only get more and more intimately included in each other. So here we have an image of a more and more ingrained mutual inclusion”
Fonte: Annemarie Mol, 2002. The Body Multiple: ontology in medical practice.
"A Geometry of Nature. The cantor dust. Begin with a line; remove the middle third; then remove the middle third of the remaining segments; and so on. The Cantor set is the dust of points that remain. They are infinitely many, but their total lenght is 0. The paradoxical qualities of such constructions disturbed nineteenth-century mathematicians, but Mandelbrot saw the Cantor set as a model for the occurence of errors in an eletronic transmission line. Engineers saw periods of error-free transmission, mixed with periods when errors would come in burst. Looked at more closely, the bursts, too, contained error-free period within them. And so on - it was an example of fractal time. At every time scale, from hours to seconds, Maldelbrot discovered that the relationship of errors to clean transmission remained constant. Such dusts, he contended, are indispensable in modeling intermittency"
Fonte: Marilyn Strathern. 2004. Partial Connections.
“Fractal is a rough or fragmented geometric shape that can be split into parts, each of which is (at least approximately) a reduced-size copy of the whole, a property called self-similarity. Roots of mathematically rigorous treatment of fractals can be traced back to functions studied by Karl Weierstrass, Georg Cantor and Felix Hausdorff in studying functions that were continuous but not differentiable; however, the term fractal was coined by Benoît Mandelbrot in 1975 and was derived from the Latin fractus meaning "broken" or "fractured." A mathematical fractal is based on an equation that undergoes iteration, a form of feedback based on recursion.
A fractal often has the following features:
• It has a fine structure at arbitrarily small scales.
• It is too irregular to be easily described in traditional Euclidean geometric language.
• It is self-similar (at least approximately or stochastically).
• It has a Hausdorff dimension which is greater than its topological dimension (although this requirement is not met by space-filling curves such as the Hilbert curve).[4]
• It has a simple and recursive definition.
Because they appear similar at all levels of magnification, fractals are often considered to be infinitely complex (in informal terms). Natural objects that are approximated by fractals to a degree include clouds, mountain ranges, lightning bolts, coastlines, snow flakes, various vegetables (cauliflower and broccoli), and animal coloration patterns. However, not all self-similar objects are fractals—for example, the real line (a straight Euclidean line) is formally self-similar but fails to have other fractal characteristics; for instance, it is regular enough to be described in Euclidean terms”.
Fonte: Wikipedia (USA)
“Fractais (do latim fractus, fração, quebrado) são figuras da geometria não-Euclidiana.
"A geometria fractal é o ramo da matemática que estuda as propriedades e comportamento dos fractais. Descreve muitas situações que não podem ser explicadas facilmente pela geometria clássica, e foram aplicadas em ciência, tecnologia e arte gerada por computador. As raízes conceituais dos fractais remontam a tentativas de medir o tamanho de objetos para os quais as definições tradicionais baseadas na geometria euclidiana falham.
Um fractal (anteriormente conhecido como curva monstro) é um objeto geométrico que pode ser dividido em partes, cada uma das quais semelhante ao objeto original. Diz-se que os fractais têm infinitos detalhes, são geralmente autossimilares e independem de escala. Em muitos casos um fractal pode ser gerado por um padrão repetido, tipicamente um processo recorrente ou iterativo.
O termo foi criado em 1975 por Benoît Mandelbrot, matemático francês nascido na Polónia, que descobriu a geometria fractal na década de 1970 do século XX, a partir do adjetivo latino fractus, do verbo frangere, que significa quebrar”.
Fonte: Wikipedia (Brasil)
segunda-feira, 23 de agosto de 2010
As palavras e as coisas - M. Foucault
As palavras e as coisas – M. Foucault
“Pois não se trata de ligar conseqüências, mas sim de aproximar e isolar, de analisar, de ajustar e encaixar conteúdos concretos; nada mais tateante, nada mais empírico (ao menos na aparência) que a instauração de uma ordem entre as coisas; nada que exija um olhar mais atento, uma linguagem mais fiel e mais bem modulada; nada que requeira com maior insistência que se deixe conduzir pela proliferação das qualidades e das formas. E, contudo, um olhar desavisado bem que poderia aproximar algumas figuras semelhantes e distinguir outras em razão de tal ou qual diferença: de fato não há, mesmo para a mais ingênua experiência, nenhuma similitude, nenhuma distinção que não resulta de uma operação precisa e da aplicação de um critério prévio. Um “sistema dos elementos” – uma definição dos segmentos sobre os quais poderão aparecer semelhanças e as diferenças, os tipos de variação de que esses segmentos poderão ser afetados, o limiar; enfim, acima do qual haverá diferença e abaixo do qual haverá similitude – é indispensável para o estabelecimento da mais simples ordem. (...) Os códigos fundamentais de uma cultura – aquele que regem sua linguagem, seus esquemas perceptivos, suas trocas, suas técnicas, seus valores, a hierarquia de suas práticas – fixam, logo de entrada, para cada homem, as ordens empíricas com as quais terá de lidar e nas quais se há de encontrar. (...) É em nome dessa ordem que os códigos de linguagem, da percepção, da prática são criticados e parcialmente invalidados. É com base nessa ordem, assumida como solo positivo, que se construíram as teorias gerais da ordenação das coisas e as interpretações que esta requer”.
Fonte: FOUCAULT, M. As palavras e as coisas (Prefácio). SP: Edit. Martins Fontes, 2002.
“Pois não se trata de ligar conseqüências, mas sim de aproximar e isolar, de analisar, de ajustar e encaixar conteúdos concretos; nada mais tateante, nada mais empírico (ao menos na aparência) que a instauração de uma ordem entre as coisas; nada que exija um olhar mais atento, uma linguagem mais fiel e mais bem modulada; nada que requeira com maior insistência que se deixe conduzir pela proliferação das qualidades e das formas. E, contudo, um olhar desavisado bem que poderia aproximar algumas figuras semelhantes e distinguir outras em razão de tal ou qual diferença: de fato não há, mesmo para a mais ingênua experiência, nenhuma similitude, nenhuma distinção que não resulta de uma operação precisa e da aplicação de um critério prévio. Um “sistema dos elementos” – uma definição dos segmentos sobre os quais poderão aparecer semelhanças e as diferenças, os tipos de variação de que esses segmentos poderão ser afetados, o limiar; enfim, acima do qual haverá diferença e abaixo do qual haverá similitude – é indispensável para o estabelecimento da mais simples ordem. (...) Os códigos fundamentais de uma cultura – aquele que regem sua linguagem, seus esquemas perceptivos, suas trocas, suas técnicas, seus valores, a hierarquia de suas práticas – fixam, logo de entrada, para cada homem, as ordens empíricas com as quais terá de lidar e nas quais se há de encontrar. (...) É em nome dessa ordem que os códigos de linguagem, da percepção, da prática são criticados e parcialmente invalidados. É com base nessa ordem, assumida como solo positivo, que se construíram as teorias gerais da ordenação das coisas e as interpretações que esta requer”.
Fonte: FOUCAULT, M. As palavras e as coisas (Prefácio). SP: Edit. Martins Fontes, 2002.
sábado, 21 de agosto de 2010
Moção Belo Monte - Committe for Human Rights / American Anthropological Association
Conforme já foi divulgado neste blog, a Associação Brasileira de Antropologia publicou uma "moção" contra a forma como o licenciamento de grandes obras de engenharia (Ex. Belo Monte) está sendo realizado no Brasil. Recentemente, o Comitê de Direitos Humanos da "American Anthropological Association" expressou sua preocupação com a forma como o licenciamento do "Complexo Hidroelétrico Belo Monte" ocorreu (sem o consentimento informado das populações locais atingidas). Essa carta foi endereçada para o coordenador das Nações Unidas no Brasil e para a Diretora do Escritório da Organização Internacional do Trabalho (OIT) (entre outros). Este documento público vem reforçar as manifestações contrárias aos procedimentos inadequados (e inconstitucionais) do atual governo brasileiro no que se refere ao licenciamento das obras de desenvolvimento, reforçando ainda mais a moção da ABA e outros documentos semelhantes. Segue abaixo o respectivo documento para conhecimento de todos, pois acredito que devemos colocá-lo em circulação em nossas redes, fortalecendo ainda mais o movimento político de questionamento das ações governamentais relacionadas ao licenciamento de grandes obras públicas.
Moção - "Committee for Human Rights - American Anthropological Association"
"Dear Sirs:
The AAA Committee for Human Rights is a permanent committee of the American Anthropological Association, the largest professional association of anthropologists worldwide. Its purpose is to stimulate informed involvement in the area of human rights among professional anthropologists and to conduct and bring before the Association leadership responsible information on selected, anthropologically relevant cases of potential human rights abuse. It is in this last role that the Committee writes this letter.
Recently, the case of the Belo Monte Hydroelectric Project in the northeastern state of Para, Brazil, has been brought to our attentions. We are concerned that the processes associated with approval of the hydroelectric dam, which would become the third largest in the world, have been unduly hastened and marked by irregularities that may seriously undermine minorities, particularly indigenous peoples. At least three injunctions against the construction of the dam, sought and obtained by court order, raise questions of environmental licensing, extent of social and environmental impacts, and the viability of the project. In addition, full and proper consultation with the communities to be affected has not met the standards for free, prior, and informed consent of the affected populations as stipulated by Brazilian national law and international treaties and conventions to which Brazil is signatory.
We note that the area to be affected, the Xingu tributary of the Amazon River, is home to twenty-four indigenous societies, whose lands have been demarcated and registered (homologado) under Brazilian law and whose rights to the lands and waterways they traditionally occupy are recognized as original (National Constitution of Brazil, Art. 231); it therefore being incumbent upon the Union to demarcate, protect, and ensure them against encroachment and harm.
We remind the entities involved of the human rights of these communities, as protected by the 1988 Charter of the Brazilian Constitution (Art 231), the 1989 Convention 169 of the International Labor Organization of the U.N., and the 2007 U.N. Declaration on the Rights of Indigenous Peoples. With the inalienability of these rights in mind, we urge the Brazilian government to revisit these decisions.
Sincerely,
Robin Root e Deborah Poole
Co-Chairs - AAA Committee on Human Rights
Moção - "Committee for Human Rights - American Anthropological Association"
"Dear Sirs:
The AAA Committee for Human Rights is a permanent committee of the American Anthropological Association, the largest professional association of anthropologists worldwide. Its purpose is to stimulate informed involvement in the area of human rights among professional anthropologists and to conduct and bring before the Association leadership responsible information on selected, anthropologically relevant cases of potential human rights abuse. It is in this last role that the Committee writes this letter.
Recently, the case of the Belo Monte Hydroelectric Project in the northeastern state of Para, Brazil, has been brought to our attentions. We are concerned that the processes associated with approval of the hydroelectric dam, which would become the third largest in the world, have been unduly hastened and marked by irregularities that may seriously undermine minorities, particularly indigenous peoples. At least three injunctions against the construction of the dam, sought and obtained by court order, raise questions of environmental licensing, extent of social and environmental impacts, and the viability of the project. In addition, full and proper consultation with the communities to be affected has not met the standards for free, prior, and informed consent of the affected populations as stipulated by Brazilian national law and international treaties and conventions to which Brazil is signatory.
We note that the area to be affected, the Xingu tributary of the Amazon River, is home to twenty-four indigenous societies, whose lands have been demarcated and registered (homologado) under Brazilian law and whose rights to the lands and waterways they traditionally occupy are recognized as original (National Constitution of Brazil, Art. 231); it therefore being incumbent upon the Union to demarcate, protect, and ensure them against encroachment and harm.
We remind the entities involved of the human rights of these communities, as protected by the 1988 Charter of the Brazilian Constitution (Art 231), the 1989 Convention 169 of the International Labor Organization of the U.N., and the 2007 U.N. Declaration on the Rights of Indigenous Peoples. With the inalienability of these rights in mind, we urge the Brazilian government to revisit these decisions.
Sincerely,
Robin Root e Deborah Poole
Co-Chairs - AAA Committee on Human Rights
sexta-feira, 20 de agosto de 2010
Belo Monte: o maior fracasso da engenharia civil
Apesar de não entender quase nada de engenharia, posso deduzir a partir do parecer de W. Antunes (publicado abaixo) que a hidroétrica Belo Monte também é considerada um fracasso do ponto de vista dos engenheiros. Conforme já ocorreu diversas vezes na história do setor público brasileiro, as obras são feitas sem o estudo adequado. Mas uma coisa é certa: alguém está ganhando muita grana com a construção de Belo Monte, mas certamente não será a sociedade brasileira e muito menos as populações indígenas e ribeirinhas que dependem do rio Xingu para sobreviver. Apesar de discordar das pessoas que não se preocupam com o bem estar dos índios e ribeirinhos (o sofrimento do outro é sempre passível de relativi-ismos), entendo como é possível não notar ou se importar com o que acontece em lugares remotos do nosso Brasil. Agora, o que eu não entendo é como as pessoas podem não se importar com o que é feito com os seus impostos. A verdade é que somos todos financiadores do "lob empresarial" irresponsável pela construção deste monstro da engenharia civil.
Crítica ao Aproveitamento Hidrelétrico Belo Monte - Walter Antunes
Considerando as informações publicadas pela EPE para eventuais interessados no leilão, a ser realizado para a construção e operação do AHE Belo Monte, é possível concluir que a construção do referido Aproveitamento Hidrelétrico Elétrico está longe de ser do interesse nacional. São conhecidos há muito tempo os dados hidrológicos do rio Xingu mediante medições de vazões em Altamira que se encontram no gráfico e tabelas abaixo.
Considerando-se que:
1- Que há exigências ambientais de se manter vazões mínimas da ordem de 1.000 m³/s (metros cúbicos por segundo) no leito original do rio Xingu, a jusante do sitio Pimental (veja desenho na página ao lado), para manter nível de água no rio que permita a sobrevivência das populações ribeirinhas indígenas e não indígenas ali radicadas;
2 - Que o funcionamento das seis máquinas da Casa de Força Complementar localizada no “Sitio Pimental” será a única forma de manter a condição acima de vazões mínimas;
3 - Ainda que as seis máquinas da Casa de Força Complementar em funcionamento usarão vazão total de 1.920 m³/s, mesmo funcionando parcialmente poderão atender às exigências de vazões mínimas no trecho que será morto, na grande curva do Xingu.
4 - Que as vazões naturais do rio Xingu extraídas do gráfico abaixo nos meses de julho a dezembro durante toda a vida útil do AHE Belo Monte serão as abaixo tabeladas.
Conclui-se que:
1 - Nos anos de vazões médias a Casa de Força Complementar nos meses de agosto a novembro será obrigada a gerar energia com todas suas turbinas, a plena carga para
manter as vazões aceitáveis ambientalmente no trecho morto da “Grande Curva do Rio
Xingu”. (só funcionarão 233 Mw)
2 - Nestes meses a Casa de Força Principal não terá água para funcionar nenhuma turbina. (Estarão parados os 18 grupos turbinas-geradores, total de 11.000 Mw).
3 - Nos meses de julho e dezembro será possível funcionar uma ou duas turbinas da
Casa de Força Principal e parar uma ou duas da Casa de Força Complementar, que sempre devem manter vazões mínimas a jusante.
4 - Nos anos em que ocorrerem vazões mínimas o AHE Belo Monte será desastroso.
Durante oito meses a água não será suficiente para acionar a plena carga nem mesmo a Casa de Força Complementar. Ficarão paradas todas as unidades geradoras da Casa de Força Principal, com 11 mil Mw de potência instalada, durante esses oito meses!
Conclusão final :
Levando-se em conta que o custo de implantação do Aproveitamento Hidrelétrico Belo Monte deverá chegar a pelo menos ¾ do custo de implantação da UHE Itaipu (que até hoje tem restos a pagar do seu financiamento) e que produzirá apenas ¼ da produção anual de Itaipu é obrigatória a conclusão de que: não é possível viabilizar- se a construção do Aproveitamento Hidrelétrico Belo Monte, em razão da sua baixíssima produtividade, sem que o Tesouro Nacional seja levado a investir, a fundo perdido, por meio das empresas públicas que compuserem a Parceria Público-Privada (PPP) que for vencedora do leilão e que se encarregará da construção e operação do pior projeto de engenharia da história de aproveitamentos hidrelétricos do Brasil e talvez da engenharia mundial. Uma vergonha para nós engenheiros.
Fonte: Edição de junho/julho de 2010 do Jornal do Instituto de Engenharia de São Paulo
http://ie.org.br/site/ieadm/arquivos/arqjornalie41.pdf
Crítica ao Aproveitamento Hidrelétrico Belo Monte - Walter Antunes
Considerando as informações publicadas pela EPE para eventuais interessados no leilão, a ser realizado para a construção e operação do AHE Belo Monte, é possível concluir que a construção do referido Aproveitamento Hidrelétrico Elétrico está longe de ser do interesse nacional. São conhecidos há muito tempo os dados hidrológicos do rio Xingu mediante medições de vazões em Altamira que se encontram no gráfico e tabelas abaixo.
Considerando-se que:
1- Que há exigências ambientais de se manter vazões mínimas da ordem de 1.000 m³/s (metros cúbicos por segundo) no leito original do rio Xingu, a jusante do sitio Pimental (veja desenho na página ao lado), para manter nível de água no rio que permita a sobrevivência das populações ribeirinhas indígenas e não indígenas ali radicadas;
2 - Que o funcionamento das seis máquinas da Casa de Força Complementar localizada no “Sitio Pimental” será a única forma de manter a condição acima de vazões mínimas;
3 - Ainda que as seis máquinas da Casa de Força Complementar em funcionamento usarão vazão total de 1.920 m³/s, mesmo funcionando parcialmente poderão atender às exigências de vazões mínimas no trecho que será morto, na grande curva do Xingu.
4 - Que as vazões naturais do rio Xingu extraídas do gráfico abaixo nos meses de julho a dezembro durante toda a vida útil do AHE Belo Monte serão as abaixo tabeladas.
Conclui-se que:
1 - Nos anos de vazões médias a Casa de Força Complementar nos meses de agosto a novembro será obrigada a gerar energia com todas suas turbinas, a plena carga para
manter as vazões aceitáveis ambientalmente no trecho morto da “Grande Curva do Rio
Xingu”. (só funcionarão 233 Mw)
2 - Nestes meses a Casa de Força Principal não terá água para funcionar nenhuma turbina. (Estarão parados os 18 grupos turbinas-geradores, total de 11.000 Mw).
3 - Nos meses de julho e dezembro será possível funcionar uma ou duas turbinas da
Casa de Força Principal e parar uma ou duas da Casa de Força Complementar, que sempre devem manter vazões mínimas a jusante.
4 - Nos anos em que ocorrerem vazões mínimas o AHE Belo Monte será desastroso.
Durante oito meses a água não será suficiente para acionar a plena carga nem mesmo a Casa de Força Complementar. Ficarão paradas todas as unidades geradoras da Casa de Força Principal, com 11 mil Mw de potência instalada, durante esses oito meses!
Conclusão final :
Levando-se em conta que o custo de implantação do Aproveitamento Hidrelétrico Belo Monte deverá chegar a pelo menos ¾ do custo de implantação da UHE Itaipu (que até hoje tem restos a pagar do seu financiamento) e que produzirá apenas ¼ da produção anual de Itaipu é obrigatória a conclusão de que: não é possível viabilizar- se a construção do Aproveitamento Hidrelétrico Belo Monte, em razão da sua baixíssima produtividade, sem que o Tesouro Nacional seja levado a investir, a fundo perdido, por meio das empresas públicas que compuserem a Parceria Público-Privada (PPP) que for vencedora do leilão e que se encarregará da construção e operação do pior projeto de engenharia da história de aproveitamentos hidrelétricos do Brasil e talvez da engenharia mundial. Uma vergonha para nós engenheiros.
Fonte: Edição de junho/julho de 2010 do Jornal do Instituto de Engenharia de São Paulo
http://ie.org.br/site/ieadm/arquivos/arqjornalie41.pdf
Blog do John Law
Para quem não conhece e tem interesse pelo tema da antropologia simétrica, vale apena dar uma olhada no blog do John Law, um dos princípias teóricos da Actor-Network Theory (ANT) junto com Latour e Callon. No Blog, existem vários artigos disponíveis para baixar. O link está na minha lista de blogs e também aqui:
http://www.heterogeneities.net/index.htm
Ele também tem um site que é uma das principais referências bibliográficas da ANT: "The Actor Network Resource", onde é possível encontrar uma lista completa de artigos e livros relacionados à ANT. Ver endereço na lista de "links interessantes" deste blog.
http://www.heterogeneities.net/index.htm
Ele também tem um site que é uma das principais referências bibliográficas da ANT: "The Actor Network Resource", onde é possível encontrar uma lista completa de artigos e livros relacionados à ANT. Ver endereço na lista de "links interessantes" deste blog.
Rapidinhas das Eleições 2010
Não sei por que, mas me sinto um pouco idiota dizendo isso. Teve início, nesta semana, o melhor show de comédia brasileira dos últimos tempos: o horário eleitoral. Nunca vi tanta bizarrice reunida num único lugar. Candidatos? Sim, temos de todos os tipos: “Zé do Lanche”; “Zorro”; “Homem-Bomba”; “Coronel”; “Capitão”; “Mostarda”; “Barrigudinho”; “Salvador da Pátria”... Guarde esse nome: “Super Homem”. Talvez seja preciso mesmo uma além-humanidade que nos salve desta vergonha. O que será? Um avião? Um carro-de-mão? Uma televisão? Não, nada disso. É o candidato do povo: é o “Zé povinho”! “Vai, vote em mim, eu estou precisando de um dinheirinho”. Com tanto desempregado no ar, o que fazer com a nossa política?
quinta-feira, 19 de agosto de 2010
Antropologia Simétrica: etnografia das ciências e dos conhecimentos indígenas e tradicionais
Aproveito o espaço para divulgar que estarei ministrando a oficina - "Antropologia Simétrica: etnografia das ciências e dos conhecimentos indígenas e tradicionais" - no âmbito do Programa de Educação Tutorial (PET) da UnB. O evento será realizado no auditório do Departamento de Sociologia, no dia 26/08, as 19hrs. A idéia é discuir diferentes "objetos" de estudo a partir da perpectiva da antropologia simétrica, abordando os seguintes temas (entre outros): ontologias, conhecimentos (científicos e tradicionais), redes e traduções. Apesar da atividade estar voltada para os estudantes do PET, quem estiver interessado em discutir o tema também pode comparecer.
terça-feira, 17 de agosto de 2010
Moção de repúdio às práticas de planejamento e de licenciamento dos projetos de desenvolvimento no Brasil - Associação Brasileira de Antropologia
A Assembléia Geral da Associação Brasileira de Antropologia vem a público manifestar o seu repúdio à condução dos processos de implementação de projetos de desenvolvimento e infraestrutura que hoje ocorrem no país à revelia dos princípios e fundamentos que deveriam nortear o planejamento estratégico das políticas estatais numa perspectiva democrática. Esses projetos podem modificar drasticamente as condições sociais e ambientais em que vivem comunidades e povos diversos, os quais são alijados dos processos decisórios. Estando reunidos no Pará, é digno de nota o emblemático caso da Usina Hidrelétrica de Belo Monte. Neste episódio, evidencia-se que a premência do desenvolvimento dos projetos e dos interesses empresariais e estatais impede a realização de estudos adequados e que os povos conheçam, reflitam e se posicionem como sujeitos diante das transformações que lhes poderão afetar. Esse processo evidencia, ainda, o desrespeito aos órgãos públicos e suas equipes técnicas, a debilidade das audiências públicas e a ausência de consultas adequadas aos povos indígenas e demais grupos sociais atingidos. É imperativo que o processo de planejamento seja pautado pelo respeito aos diversos modos de vida e territorialidades vividas pelos grupos sociais. É inaceitável que nos processos de implementação dos projetos sejam desrespeitados os princípios que amparam as normas e os prazos previstos na legislação. A constituição de uma sociedade livre, justa e democrática pressupõe o reconhecimento da legitimidade de todos os interessados na construção do processo decisório e no constante exercício do controle sobre as decisões tomadas. É por isso que, reunidos em assembléia geral, repudiamos a forma arbitrária como vem sendo conduzido esse processo e exigimos o respeito aos princípios constitucionais.
Belo Monte: uma ameaça aos valores democráticos
Já tive a oportunidade de mencionar aqui os problemas envolvendo a construção da Usina Hidroelétrica Belo Monte e como esse projeto governamental representa uma ameaça ao modo de vida de humanos e não-humanos que vivem na (dá) bacia do rio Xingu. Apesar das mobilizações políticas de povos indígenas, comunidades locais ribeirinhas e organizações civis, que manifestaram a necessidade de discutir e debater melhor o assunto, a presidência da república continua tratando a questão como um problema “superado”.
As populações afetadas direta e indiretamente por grandes obras como Belo Monte têm o direito de entender o que está em jogo e se posicionar politicamente, seja de forma favorável ou não. A própria sociedade civil tem o direito de exigir uma ampliação do debate sobre a proposta do governo. Precisamos refletir sobre a nossa matriz energética, pensar a partir de experiências passadas e presentes, enfim, dialogar com maior propriedade sobre uma questão de extrema importância para todos nós. Obras do porte da Belo Monte são complexas o suficiente para exigir do governo e da sociedade um tempo maior de estudo e discussão. Trata-se de empreendimentos tecnológicos e sociais de extrema complexidade, geralmente, envolvendo também um campo de conflitos entre interesses divergentes. O que caberia ao governo, neste caso, seria conduzir e oportunizar o debate público, pensar alternativas, enfim, estudar ele mesmo com mais calma e atenção a questão, não somente do ponto de vista econômico, mas também do ponto de vista socioambiental. De fato, o grande desafio dessa obra é que os seus efeitos são múltiplos: estamos exatamente no ponto de encontro (e superação) entre tecnologia e sociedade. Buscar um melhor entendimento do que está em jogo nessa obra não só é um desafio para todos nós, como também deveria ser uma política de governo.
O fundamental, neste caso, é que os povos indígenas e ribeirinhos têm o direito de entender o que está acontecendo nas suas vidas e esse entendimento exige não só um esforço imenso de tradução e discussão, como também o respeito a uma temporalidade (a temporalidade do entendimento) que difere da temporalidade governamental. Afinal, são essas pessoas que terão suas vidas afetadas pela obra. Apesar de existirem tantos outros interesses (técnicos, políticos, econômicos) envolvidos na construção de Belo Monte, o interesse mais importante é o interesse dos povos e das comunidades que terão o seu meio ambiente alterado e, desta forma, a sua vida afetada por mudanças que eles ainda não tiveram o tempo nem mesmo de entender, muito menos ainda de se opor. A vida em democracia exige o livre debate como prerrogativa da sociedade na sua relação com o poder público. A existência de um “Estado de Direito” pressupõe exatamente isso: o direito da sociedade em orientar a ação do estado. Todo e qualquer movimento contrário aos direitos civis e socioambientais pode e deve ser entendido como uma ameaça aos valores mais caros da nossa Constituição. É fundamental que o governo observe e respeite os procedimentos legais que envolvem o licenciamento de grandes obras como Belo Monte. Os laudos, relatórios e pareceres técnicos não podem ser tratados como meros “entraves burocráticos”, mas devem ser observados como uma referência importante e necessária na tomada de decisões políticas, além de ser um importante dispositivo legal.
Quando esses dispositivos institucionais não são observados pelo poder público (seja ele federal, estadual ou municipal), cabe ao Ministério Público sair em defesa dos interesses coletivos da sociedade, caso contrário, estaremos abrindo precedentes perigosos.
Durante a última Reunião Brasileira de Antropologia, realizada em Belém, esse tema foi amplamente debatido em diversos grupos de trabalho, sendo que três desses grupos acabaram redigindo uma moção que foi posteriormente lida e discutida na assembléia da ABA. Essa moção foi apoiada pala associação e tornou-se pública. Agora a nossa tarefa é tentar fazer com que ela circule nas redes virtuais e reais, pois com o apoio de todos talvez ainda seja possível pressionar o Governo Federal a rever seus planos.
As populações afetadas direta e indiretamente por grandes obras como Belo Monte têm o direito de entender o que está em jogo e se posicionar politicamente, seja de forma favorável ou não. A própria sociedade civil tem o direito de exigir uma ampliação do debate sobre a proposta do governo. Precisamos refletir sobre a nossa matriz energética, pensar a partir de experiências passadas e presentes, enfim, dialogar com maior propriedade sobre uma questão de extrema importância para todos nós. Obras do porte da Belo Monte são complexas o suficiente para exigir do governo e da sociedade um tempo maior de estudo e discussão. Trata-se de empreendimentos tecnológicos e sociais de extrema complexidade, geralmente, envolvendo também um campo de conflitos entre interesses divergentes. O que caberia ao governo, neste caso, seria conduzir e oportunizar o debate público, pensar alternativas, enfim, estudar ele mesmo com mais calma e atenção a questão, não somente do ponto de vista econômico, mas também do ponto de vista socioambiental. De fato, o grande desafio dessa obra é que os seus efeitos são múltiplos: estamos exatamente no ponto de encontro (e superação) entre tecnologia e sociedade. Buscar um melhor entendimento do que está em jogo nessa obra não só é um desafio para todos nós, como também deveria ser uma política de governo.
O fundamental, neste caso, é que os povos indígenas e ribeirinhos têm o direito de entender o que está acontecendo nas suas vidas e esse entendimento exige não só um esforço imenso de tradução e discussão, como também o respeito a uma temporalidade (a temporalidade do entendimento) que difere da temporalidade governamental. Afinal, são essas pessoas que terão suas vidas afetadas pela obra. Apesar de existirem tantos outros interesses (técnicos, políticos, econômicos) envolvidos na construção de Belo Monte, o interesse mais importante é o interesse dos povos e das comunidades que terão o seu meio ambiente alterado e, desta forma, a sua vida afetada por mudanças que eles ainda não tiveram o tempo nem mesmo de entender, muito menos ainda de se opor. A vida em democracia exige o livre debate como prerrogativa da sociedade na sua relação com o poder público. A existência de um “Estado de Direito” pressupõe exatamente isso: o direito da sociedade em orientar a ação do estado. Todo e qualquer movimento contrário aos direitos civis e socioambientais pode e deve ser entendido como uma ameaça aos valores mais caros da nossa Constituição. É fundamental que o governo observe e respeite os procedimentos legais que envolvem o licenciamento de grandes obras como Belo Monte. Os laudos, relatórios e pareceres técnicos não podem ser tratados como meros “entraves burocráticos”, mas devem ser observados como uma referência importante e necessária na tomada de decisões políticas, além de ser um importante dispositivo legal.
Quando esses dispositivos institucionais não são observados pelo poder público (seja ele federal, estadual ou municipal), cabe ao Ministério Público sair em defesa dos interesses coletivos da sociedade, caso contrário, estaremos abrindo precedentes perigosos.
Durante a última Reunião Brasileira de Antropologia, realizada em Belém, esse tema foi amplamente debatido em diversos grupos de trabalho, sendo que três desses grupos acabaram redigindo uma moção que foi posteriormente lida e discutida na assembléia da ABA. Essa moção foi apoiada pala associação e tornou-se pública. Agora a nossa tarefa é tentar fazer com que ela circule nas redes virtuais e reais, pois com o apoio de todos talvez ainda seja possível pressionar o Governo Federal a rever seus planos.
sexta-feira, 13 de agosto de 2010
Lançamento de Livros na Livraria Zouk - Porto Alegre/RS
Lançamento de mais duas coletâneas da editora da UFRGS na livraria Zouk, em Porto Alegre, no próximo dia 16 de agosto, às 18:30.
Experiências, dilemas e desafios do fazer etnográfico contemporâneo
(Org. Patrice Schuch, Miriam Vieira e Roberta Peters)
Este livro pretende discutir como a relação entre o processo de pesquisa e a produção de teorias e dados na antropologia se expressa na minúcia do trabalho antropológico, focalizando prioritariamente quatro dimensões: definição dos universos e problemas de pesquisa, escrita do diário de campo, dimensão temporal da pesquisa e a relação ética e a pesquisa na antropologia.
Dinâmicas de Cidadania: abordagens etnográficas sobre a diversidade
(Org. Cíntia Beatriz Muller e Miriam Chagas)
O fazer etnográfico é valorizado por seu potencial crítico de análise, principalmente quando discorre sobre a forma como as pessoas vivenciam as políticas a elas direcionadas e seus efeitos. A etnografia do "encontro" entre diferentes subjetividades e sensibilidades permite, assim, dar visibilidade à diversidade cultural e às reivindicações específicas dos grupos, bem como aos modos com que os mesmos grupos percebem o próprio antropólogo.
A Livraria Zouk está localizada na R. Garibaldi, 1333. Essas e outras coletâneas produzidas pela equipe do Núcleo de Antropologia e Cidadania (NACI/UFRGS) podem ser adquiridas pelo site da livraria Zouk:
http://www.livrariazouk.com.br/
Experiências, dilemas e desafios do fazer etnográfico contemporâneo
(Org. Patrice Schuch, Miriam Vieira e Roberta Peters)
Este livro pretende discutir como a relação entre o processo de pesquisa e a produção de teorias e dados na antropologia se expressa na minúcia do trabalho antropológico, focalizando prioritariamente quatro dimensões: definição dos universos e problemas de pesquisa, escrita do diário de campo, dimensão temporal da pesquisa e a relação ética e a pesquisa na antropologia.
Dinâmicas de Cidadania: abordagens etnográficas sobre a diversidade
(Org. Cíntia Beatriz Muller e Miriam Chagas)
O fazer etnográfico é valorizado por seu potencial crítico de análise, principalmente quando discorre sobre a forma como as pessoas vivenciam as políticas a elas direcionadas e seus efeitos. A etnografia do "encontro" entre diferentes subjetividades e sensibilidades permite, assim, dar visibilidade à diversidade cultural e às reivindicações específicas dos grupos, bem como aos modos com que os mesmos grupos percebem o próprio antropólogo.
A Livraria Zouk está localizada na R. Garibaldi, 1333. Essas e outras coletâneas produzidas pela equipe do Núcleo de Antropologia e Cidadania (NACI/UFRGS) podem ser adquiridas pelo site da livraria Zouk:
http://www.livrariazouk.com.br/
terça-feira, 10 de agosto de 2010
Conservação, Vida Social e Desenvolvimento entre os Povos Indígenas Kayapó do Sudeste da Amazônia - Parte II
Parte II (Continuação)
Neste espaço, não pretendo tecer ou aprofundar questões antropológicas sobre os Kayapós da A’Ukre. Gostaria apenas de apresentar breves observações sobre essa última experiência que tive entre os índios Mebêngôkre – os homens do buraco/lugar d’água – conforme eles se autodenominam.
Dados históricos e etnológicos apontam para a existência originária de três grandes grupos desta etnia: os Irã-‘ãmranh-re (“os que passeiam nas planícies”); os Goroti Kumrenhtx (“os homens do verdadeiro grande grupo”); e os Porekry (“os homens dos pequenos bambus”). Esses três grandes grupos habitavam desde tempos imemoriais a região do rio Tocantins, numa região de transição mais acentuada entre o cerrado e a floresta tropical, aproveitando os recursos diferenciados destes dois biomas. O seu modo de vida, no entanto, foi fortemente afetado pelos primeiros contatos com os “brancos” colonizadores, ainda no início do século XIX. Devido à violência desse primeiro contato, os Kayapó migraram para o oeste, adentrando o interior do país. Após um breve período de paz, devido à expansão da fronteira de colonização, esses índios enfrentaram novamente a situação de contato. Nesse momento, houve uma cisão interna: uma parte era favorável ao estabelecimento de relações com os brancos e a outra parte não. Essa cisão acabou ocasionando uma série de subdivisões internas e a conseqüente fragmentação desses três grandes grupos originários. Os subgrupos que decidiram estabelecer relações com o branco foram, em grande medida, exterminados. Já os sobreviventes continuaram a sua migração em direção ao oeste e, após se estabelecerem em seu novo território, passaram a atacar todos que se aproximassem deles. Já mais recentemente, nas décadas de 1950/60, o Governo Brasileiro enviou equipes para “pacificar” os Kayapós, que, desde então, entraram em contato definitivo com a sociedade nacional.
Durante as décadas de 1980/90, os Kayapó ficaram conhecidos na mídia brasileira e internacional devido à sua mobilização em prol dos seus direitos políticos e territoriais. Foi nessa época que lideranças como Ropni (Raoni) e Bepkoroti (Paulinho Payakã) ficaram famosos no mundo inteiro, aparecendo ao lado de artistas, personalidades e chefes de estado. O evento mais importante desta fase mais recente da história do contato com a sociedade nacional foi o grande encontro indígena de Altamira, realizado em fevereiro de 1989 em parceria com outros 24 povos indígenas, ambientalistas e antropólogos. Inclusive, é importante mencionar o apoio de Janet Chernela, Barbara Zimmerman, Terence Turner e Darell Posey durante essas mobilizações políticas. Apesar dessa “parceria” ter servido para dar maior visibilidade às demandas políticas dos Kayapó, a imagem idealizada de muitos ambientalistas acabou gerando alguns conflitos de entendimento dos interesses indígenas e não-indígenas envolvidos nessa associação. Por outro lado, a visibilidade alcançada pelos Kayapó no cenário internacional resultou num vasto conhecimento etnológico e etnobiológico sobre o grupo, o que, em certa medida, também ajudou a fortalecer os seus direitos territoriais e intelectuais.
A própria aldeia da A’Ukre foi afetada por essa visibilidade política ao se tornar um dos “cenários” de uma inusitada parceria com a Body Shop, empresa multinacional do setor de higiene pessoal sediada na Inglaterra. Os contornos dessa parceria foram delineados ainda no encontro de Altamira, em 1989, quando Payakã – um dos principais líderes políticos desta aldeia – convidou representantes desta instituição para buscarem alternativas ambientalmente sustentáveis e que pudessem atender as demandas econômicas do seu povo. Foi assim que surgiu o projeto de exploração do óleo extraído da castanha e usado pela empresa na fabricação de seus produtos de higiene (condicionadores de cabelos). Desde o início desse empreendimento, a parceria foi permeada por inúmeros conflitos entre a mentalidade capitalista (o significado do empréstimo e da poupança) e as formas comunitárias de agenciamento indígena do empreendimento. Esses conflitos se intensificaram ainda mais com a “regulamentação” das atividades de acesso ao “patrimônio genético” e aos “conhecimentos tradicionais associados”, inviabilizando por completo a continuação do projeto. Hoje em dia, conforme pude observar, o único sinal dessa parceria na aldeia A’Ukre é a presença, em estado de completo abandono, da infra-estrutura utilizada no armazenamento, extração e transporte do óleo de castanha.
Os Mebêngôkre da A’Ukre também são conhecidos pela sua associação, durante boa parte da década de 1980, com garimpeiros atraídos pelo ouro existente em suas terras. Apesar da dificuldade enfrentada pelos índios para controlar o fluxo de ouro e as conseqüências sociais, políticas e culturais originadas da presença de forasteiros em suas terras, os kayapós obtiveram relativo sucesso ao controlar e administrar esse fluxo através da cobrança de uma taxa de 10% sobre todo o ouro extraído pelos garimpeiros. O dinheiro adquirido com a cobrança da taxa foi investido no patrulhamento do seu território com o auxílio de aviões e a conta bancária dos caciques de Goritire cresceu sensivelmente durante esse período. Mas o eldorado kayapó acabou em meados da década de 1990, quando foi substituído pela presença dos madeireiros, que adentraram o território kayapó para extrair a valiosa madeira de mogno. Não há dúvida que essas duas formas de associação com atores da sociedade nacional afetaram sensivelmente o modo de vida kayapó, mas, por outro lado, precisamos reconhecer a capacidade de autodeterminação histórica desse povo, que mesmo diante de situações de desigualdade de força e poder, buscou controlar a situação de contato através da manutenção da sua vida cerimonial. A abertura para a relação com os “brancos” também nunca foi consenso entre os chefes kayapós. O filme de Terry Turner, “The Kayapó”, que tivemos a oportunidade de assistir na aldeia junto com a comunidade da A’Ukre, retrata esse momento e as divergências entre chefes favoráveis e contrários a relação com os garimpeiros.
Outra iniciativa importante foi o estabelecimento, em 1992, de uma base científica localizada 15 km a montante da aldeia, a “Reserva e Estação de Pesquisa do Pinkaiti”, resultado de uma parceria entre os chefes políticos locais e a ONG Conservação Internacional. A idéia inicial desse projeto era buscar, com apoio de pesquisadores, alternativas de conservação de uma população de mogno em uma área de cerca de 8 mil hectares de terra. Essa iniciativa conservacionista foi pensada em contraponto as iniciativas comerciais levadas a diante pelos próprios Kayapós, que por muito tempo mantiveram relações econômicas com os madeireiros. Desde então, foram vários os pesquisadores que foram desenvolver seus trabalhos de pesquisa na Reserva, o que acabou gerando alternativas de renda para a comunidade da A’Ukre: o pagamento, por parte dos cientistas, de taxas de ingresso e permanência na comunidade; e o emprego remunerado de auxiliares e assistentes indígenas nas pesquisas (ver mais sobre essa iniciativa no Programa do Curso, anexado neste blog na página ao lado). Inclusive, A’Ukre seria um contexto excelente para a realização de uma pesquisa na área de etnologia e antropologia da ciência, devido à existência de uma relação histórica entre cientistas e comunidade.
Acima de qualquer julgamento sobre o mérito de tais “parcerias” com cientistas e empresas (assunto complexo que não merece ser tratado aqui), o fato é que os Kayapó têm demonstrado sua capacidade histórica de, mesmo quando em situações limitadas, optar e escolher formas diferentes de lidar com a diferença.
Continua em breve...
Neste espaço, não pretendo tecer ou aprofundar questões antropológicas sobre os Kayapós da A’Ukre. Gostaria apenas de apresentar breves observações sobre essa última experiência que tive entre os índios Mebêngôkre – os homens do buraco/lugar d’água – conforme eles se autodenominam.
Dados históricos e etnológicos apontam para a existência originária de três grandes grupos desta etnia: os Irã-‘ãmranh-re (“os que passeiam nas planícies”); os Goroti Kumrenhtx (“os homens do verdadeiro grande grupo”); e os Porekry (“os homens dos pequenos bambus”). Esses três grandes grupos habitavam desde tempos imemoriais a região do rio Tocantins, numa região de transição mais acentuada entre o cerrado e a floresta tropical, aproveitando os recursos diferenciados destes dois biomas. O seu modo de vida, no entanto, foi fortemente afetado pelos primeiros contatos com os “brancos” colonizadores, ainda no início do século XIX. Devido à violência desse primeiro contato, os Kayapó migraram para o oeste, adentrando o interior do país. Após um breve período de paz, devido à expansão da fronteira de colonização, esses índios enfrentaram novamente a situação de contato. Nesse momento, houve uma cisão interna: uma parte era favorável ao estabelecimento de relações com os brancos e a outra parte não. Essa cisão acabou ocasionando uma série de subdivisões internas e a conseqüente fragmentação desses três grandes grupos originários. Os subgrupos que decidiram estabelecer relações com o branco foram, em grande medida, exterminados. Já os sobreviventes continuaram a sua migração em direção ao oeste e, após se estabelecerem em seu novo território, passaram a atacar todos que se aproximassem deles. Já mais recentemente, nas décadas de 1950/60, o Governo Brasileiro enviou equipes para “pacificar” os Kayapós, que, desde então, entraram em contato definitivo com a sociedade nacional.
Durante as décadas de 1980/90, os Kayapó ficaram conhecidos na mídia brasileira e internacional devido à sua mobilização em prol dos seus direitos políticos e territoriais. Foi nessa época que lideranças como Ropni (Raoni) e Bepkoroti (Paulinho Payakã) ficaram famosos no mundo inteiro, aparecendo ao lado de artistas, personalidades e chefes de estado. O evento mais importante desta fase mais recente da história do contato com a sociedade nacional foi o grande encontro indígena de Altamira, realizado em fevereiro de 1989 em parceria com outros 24 povos indígenas, ambientalistas e antropólogos. Inclusive, é importante mencionar o apoio de Janet Chernela, Barbara Zimmerman, Terence Turner e Darell Posey durante essas mobilizações políticas. Apesar dessa “parceria” ter servido para dar maior visibilidade às demandas políticas dos Kayapó, a imagem idealizada de muitos ambientalistas acabou gerando alguns conflitos de entendimento dos interesses indígenas e não-indígenas envolvidos nessa associação. Por outro lado, a visibilidade alcançada pelos Kayapó no cenário internacional resultou num vasto conhecimento etnológico e etnobiológico sobre o grupo, o que, em certa medida, também ajudou a fortalecer os seus direitos territoriais e intelectuais.
A própria aldeia da A’Ukre foi afetada por essa visibilidade política ao se tornar um dos “cenários” de uma inusitada parceria com a Body Shop, empresa multinacional do setor de higiene pessoal sediada na Inglaterra. Os contornos dessa parceria foram delineados ainda no encontro de Altamira, em 1989, quando Payakã – um dos principais líderes políticos desta aldeia – convidou representantes desta instituição para buscarem alternativas ambientalmente sustentáveis e que pudessem atender as demandas econômicas do seu povo. Foi assim que surgiu o projeto de exploração do óleo extraído da castanha e usado pela empresa na fabricação de seus produtos de higiene (condicionadores de cabelos). Desde o início desse empreendimento, a parceria foi permeada por inúmeros conflitos entre a mentalidade capitalista (o significado do empréstimo e da poupança) e as formas comunitárias de agenciamento indígena do empreendimento. Esses conflitos se intensificaram ainda mais com a “regulamentação” das atividades de acesso ao “patrimônio genético” e aos “conhecimentos tradicionais associados”, inviabilizando por completo a continuação do projeto. Hoje em dia, conforme pude observar, o único sinal dessa parceria na aldeia A’Ukre é a presença, em estado de completo abandono, da infra-estrutura utilizada no armazenamento, extração e transporte do óleo de castanha.
Os Mebêngôkre da A’Ukre também são conhecidos pela sua associação, durante boa parte da década de 1980, com garimpeiros atraídos pelo ouro existente em suas terras. Apesar da dificuldade enfrentada pelos índios para controlar o fluxo de ouro e as conseqüências sociais, políticas e culturais originadas da presença de forasteiros em suas terras, os kayapós obtiveram relativo sucesso ao controlar e administrar esse fluxo através da cobrança de uma taxa de 10% sobre todo o ouro extraído pelos garimpeiros. O dinheiro adquirido com a cobrança da taxa foi investido no patrulhamento do seu território com o auxílio de aviões e a conta bancária dos caciques de Goritire cresceu sensivelmente durante esse período. Mas o eldorado kayapó acabou em meados da década de 1990, quando foi substituído pela presença dos madeireiros, que adentraram o território kayapó para extrair a valiosa madeira de mogno. Não há dúvida que essas duas formas de associação com atores da sociedade nacional afetaram sensivelmente o modo de vida kayapó, mas, por outro lado, precisamos reconhecer a capacidade de autodeterminação histórica desse povo, que mesmo diante de situações de desigualdade de força e poder, buscou controlar a situação de contato através da manutenção da sua vida cerimonial. A abertura para a relação com os “brancos” também nunca foi consenso entre os chefes kayapós. O filme de Terry Turner, “The Kayapó”, que tivemos a oportunidade de assistir na aldeia junto com a comunidade da A’Ukre, retrata esse momento e as divergências entre chefes favoráveis e contrários a relação com os garimpeiros.
Outra iniciativa importante foi o estabelecimento, em 1992, de uma base científica localizada 15 km a montante da aldeia, a “Reserva e Estação de Pesquisa do Pinkaiti”, resultado de uma parceria entre os chefes políticos locais e a ONG Conservação Internacional. A idéia inicial desse projeto era buscar, com apoio de pesquisadores, alternativas de conservação de uma população de mogno em uma área de cerca de 8 mil hectares de terra. Essa iniciativa conservacionista foi pensada em contraponto as iniciativas comerciais levadas a diante pelos próprios Kayapós, que por muito tempo mantiveram relações econômicas com os madeireiros. Desde então, foram vários os pesquisadores que foram desenvolver seus trabalhos de pesquisa na Reserva, o que acabou gerando alternativas de renda para a comunidade da A’Ukre: o pagamento, por parte dos cientistas, de taxas de ingresso e permanência na comunidade; e o emprego remunerado de auxiliares e assistentes indígenas nas pesquisas (ver mais sobre essa iniciativa no Programa do Curso, anexado neste blog na página ao lado). Inclusive, A’Ukre seria um contexto excelente para a realização de uma pesquisa na área de etnologia e antropologia da ciência, devido à existência de uma relação histórica entre cientistas e comunidade.
Acima de qualquer julgamento sobre o mérito de tais “parcerias” com cientistas e empresas (assunto complexo que não merece ser tratado aqui), o fato é que os Kayapó têm demonstrado sua capacidade histórica de, mesmo quando em situações limitadas, optar e escolher formas diferentes de lidar com a diferença.
Continua em breve...
segunda-feira, 9 de agosto de 2010
Porque a candidatura de Marina Silva é um evento único na política nacional?
Primeiro, devido a sua trajetória de vida, que a coloca lado a lado com os povos indígenas, comunidades amazônicas e ambientalistas que sempre estiveram conectados com o discurso socioambiental. Marina esteve ao lado de Chico Mendes, participou do movimento de base no Acre, da formação do Partido dos Trabalhadores, enfim, de inúmeros movimentos políticos diretamente ligados à temática ambiental e aos direitos humanos. A sua força política retira seu embasamento da prática concreta, do cotidiano de luta ao lado dos povos que representam o que ela sempre acreditou. Essa qualidade faz com que a sua candidatura seja a mais sensata em meio ao mar desenvolvimentista. O seu lado humano a torna diferente de seus colegas tecnocratas (Dilma e Serra), pois a sua proposta de governo surge da idéia de que precisamos de uma mudança na forma de fazer política. Precisamos de uma política governamental que leve em conta fenômenos como a crise ambiental e o aquecimento global na agenda de governo e que defenda os interesses das populações tradicionais e indígenas que conhecem e vivem a floresta de outra forma: não como um objeto meramente utilitário, mas como uma fonte que alimenta o pensamento.
Segundo, a campanha política de Marina foi organizada da forma mais descentralizada possível e conta com a participação direta e indireta de seus próprios eleitores. O “O Movimento Marina Silva” está distribuído e organizado em forma de redes (virtuais ou reais) que possuem uma autonomia relativa na hora de planejar ações e reações. Trata-se de um movimento aberto para a participação de todos, não somente dos partidários, mas também de pessoas que apesar de serem apartidárias, acreditam na possibilidade de construir uma nova forma de fazer e pensar a política.
Terceiro, a intervenção de Marina em eventos políticos tem sido marcada pela boa poesia. Marina também sabe transformar suas propostas políticas em sentimento poético. Há muito tempo que a política brasileira precisa de poesia: para libertar a alma da ganância e da corrupção.
Viva Marina e sua poesia do dia a dia. Cenas cotidianas transformadas em sentimento estético, ético, poético.
Conforme dizia outro grande poeta do cotidiano: “a poesia não é de quem faz, é de quem precisa”. Sim, Marina, nós precisamos de boa poesia nessas eleições!
Sou o arco, sou a flecha.
Sou todo em metades.
Sou as partes que se mesclam
Nos propósitos e nas vontades
Sou o arco por primeiro,
Sou a flecha por segundo,
Sou a flecha por primeiro,
Sou o arco por segundo
Buscai o melhor de mim
E terás o melhor de mim.
Darei o melhor de mim
Onde precisar o mundo.
Marina Silva (Poeta, Professora, Senadora e Candidata à Presidência da República)
Segundo, a campanha política de Marina foi organizada da forma mais descentralizada possível e conta com a participação direta e indireta de seus próprios eleitores. O “O Movimento Marina Silva” está distribuído e organizado em forma de redes (virtuais ou reais) que possuem uma autonomia relativa na hora de planejar ações e reações. Trata-se de um movimento aberto para a participação de todos, não somente dos partidários, mas também de pessoas que apesar de serem apartidárias, acreditam na possibilidade de construir uma nova forma de fazer e pensar a política.
Terceiro, a intervenção de Marina em eventos políticos tem sido marcada pela boa poesia. Marina também sabe transformar suas propostas políticas em sentimento poético. Há muito tempo que a política brasileira precisa de poesia: para libertar a alma da ganância e da corrupção.
Viva Marina e sua poesia do dia a dia. Cenas cotidianas transformadas em sentimento estético, ético, poético.
Conforme dizia outro grande poeta do cotidiano: “a poesia não é de quem faz, é de quem precisa”. Sim, Marina, nós precisamos de boa poesia nessas eleições!
Sou o arco, sou a flecha.
Sou todo em metades.
Sou as partes que se mesclam
Nos propósitos e nas vontades
Sou o arco por primeiro,
Sou a flecha por segundo,
Sou a flecha por primeiro,
Sou o arco por segundo
Buscai o melhor de mim
E terás o melhor de mim.
Darei o melhor de mim
Onde precisar o mundo.
Marina Silva (Poeta, Professora, Senadora e Candidata à Presidência da República)
sábado, 7 de agosto de 2010
Conservação, Vida Social e Desenvolvimento entre os Povos Indígenas Kayapó do Sudeste da Amazônia
Parte I
Entre os dias 17 e 31 de julho de 2010, viajei para o sudeste do Pará para participar como instrutor de um curso de campo sobre a interface entre povos indígenas e conservação ambiental. A iniciativa é resultado de uma parceria entre a Universidade de Maryland, a Universidade de Brasília, a Associação Floresta Protegida (AFP) e a Fundação Nacional do Índio (FUNAI). A minha primeira experiência com o curso ocorreu em 2008, quando participei como estudante da UNB. Já neste ano, a minha inserção se deu na condição de “colaborador” da AFP, ONG que representa 9 aldeias Kayapó localizadas na TI Kayapó. Para saber informações mais detalhadas sobre o histórico e os objetivos do curso, ver na página deste blog (que tem o mesmo título desta postagem).
A minha jornada teve início no dia 17, em Brasília, quando embarquei num vôo em direção à cidade de Marabá, localizada na região sudeste do Pará, na companhia dos dois estudantes da UNB que participaram do curso e Maria Beatriz Ribeiro, instrutora da área de ecologia. Ao chegar nessa cidade, cuja povoação teve início ao final do século XIX, notei que a grande nuvem de poeira que paira sobre a região é mais um dos sinais do ritmo frenético de crescimento que esta cidade tem enfrentado nos últimos 15 anos, além das máquinas e canteiros de obras que se espalham por toda parte.
Ao desembarcar no aeroporto, encontramos o grupo de estudantes norte-americanos e a outra instrutora do módulo da aldeia A’Ukre, a antropóloga Laura Zanotti. Ao entrar no ônibus, a expressão do grupo apontava para o extremo cansaço após 9 horas de deslocamento entre Belém e Marabá. Dali seguimos viagem até Tucumã, pequena cidade localizada mais ao sul, onde encontramos o quarto instrutor do curso, o ecólogo Adriano Jerozolimskie, que também exerce a função de coordenador da AFP. O percurso até lá foi um pouco conturbado devido à péssima qualidade das estradas. Lembro que, em 2008, quando estive na região pela primeira vez, o mesmo trecho rodoviário estava em melhores condições, o que indica a má qualidade do asfalto usado na pavimentação da estrada, que até pouco tempo atrás era de terra batida.
Ficamos em Tucumã somente até a manha do dia 19, quando partimos em quatro pequenos aviões em direção à aldeia A’Ukre, localizada na TI Kayapó. Durante esse breve período, aproveitamos para nos conhecermos melhor, fazer a última compra de mantimentos e finalizar a organização do cronograma de atividades que seriam realizadas tanto na aldeia como na base científica do Pinkaiti. A maior parte dos nossos mantimentos tinha sido enviada via barco alguns dias antes e estava a nossa espera na aldeia.
A viagem até a A’Ukre foi uma experiência incrível. Sobrevoamos a TI Kayapó até chegarmos à aldeia. O vôo foi maravilhoso. Como esse tipo de aeronave voa em menor altitude e o céu estava claro, foi possível observar a zona de transição entre o Cerrado e a Floresta Tropical, uma das regiões mais lindas da Amazônia. Na medida em que nos aproximamos da aldeia, o tapete verde abaixo de nós foi assumindo proporção exuberante, revelando que estávamos entrando na terra indígena dos Kayapó, uma gigantesca “ilha verde” que resiste ao avanço do chamado arco do desmatamento.
A chegada na A’Ukre foi repleta de alegria. Ao descer do avião, recebi as boas vindas de Begoti (Tiago), jovem liderança Kayapó (em torno de 40 anos) que conheci em 2008, durante a viagem que fizemos pelo rio Xingu, ocasião em que visitamos outras duas aldeias Kayapó (Kokraimoro e Pukararânkre). Tanto ele como os demais indígenas que estavam nos aguardando na pista de avião da aldeia pareciam felizes ao nos ver ali.
Neste primeiro dia na aldeia, almoçamos e aproveitamos o restante da tarde para tomar banho no rio Fresco, um dos inúmeros afluentes do rio Xingu. No final do dia, nos reunimos na Casa dos Guerreiros, localizada ao centro da aldeia, com os dois caciques da A’Ukre e seus respectivos grupos políticos. Após as devidas apresentações, Adriano falou sobre o carregamento de miçangas adquirido – por vontade e decisão direta da comunidade – com a taxa comunitária paga por cada estudante norte-americano (U$ 400,00): nada mais, nada menos do que 150 kg de miçangas que seriam usadas logo após a nossa saída da aldeia numa cerimônia de nomeação, um dos momentos mais importantes da vida ritual Kayapó. Também discutimos com a comunidade quais os instrutores indígenas que participariam do curso neste ano, além de esclarecimentos sobre a sua remuneração.
Ainda quando estávamos em Tucumã, decidimos dividir os estudantes (8 norte-americanos e 2 brasileiros) em dois grupos: o primeiro grupo ficaria na aldeia, enquanto o outro permaneceria na base científica de Pinkaiti, com previsão de troca no dia 24, sendo que o retorno do “grupo b” estava previsto para o dia 28, com previsão de retorno para Tucumã na manha do dia 30. Eu e Laura Zanotti ficamos responsáveis por conduzir as atividades na aldeia, enquanto Adriano e Fabiana (ambos responsáveis pelo tópico de conservação ambiental) ficaram locados na base científica.
Nos dias seguintes, ambos os grupos vivenciaram o mesmo ciclo de atividades na aldeia: oficina de etnografia e anotações de campo; visita às roças para apreender sobre o trabalho e a variedade de espécies agrícolas cultivada pelos Kayapó; pintura corporal; conversa com os caciques sobre a política aldeã; caminhadas na aldeia para apreender a distribuição do espaço sociopolítico e sua organização comunitária; trilhas na companhia dos instrutores indígenas; discussão sobre os serviços de educação e saúde na aldeia; direitos de imagem; a problemática da regulamentação jurídico-governamental do “acesso” aos “conhecimentos tradicionais associados” ao “patrimônio genético”; consentimento informado, repartição de benefícios e direitos indígenas. Todas essas atividades foram seguidas de seminários de discussão e leitura realizados à noite. Já durante a permanência na base científica, cada um dos grupos fez diversas trilhas no meio da mata para identificação dos diferentes tipos de paisagem; visitou uma cachoeira; fez trilhas e saiu para pescar com os instrutores indígenas e não-indígenas; realizou seminários sobre temas relacionados à conservação ambiental na região; e assistiu documentários sobre povos indígenas. Durante o período que os estudantes permaneceram em Pinkaiti, eles tiveram a companhia constante de 8 instrutores indígenas e retornaram para a aldeia com um pequeno vocabulário em língua Kayapó, que depois tentaram colocar em prática durante o seu período na aldeia. Além das atividades previstas no cronograma oficial do curso, costumávamos receber visitas constantes dos kayapós de manha, de tarde e a noite, além dos estudantes terem participado de momentos mais informais da vida comunitária: banhos de rio no final da tarde, jogos de futebol, festa e pesca. Já no segundo dia de permanência na aldeia, todos os estudantes tiveram os seus corpos pintados com jenipapo, dando início a um processo de imersão na vida comunitária que teve como momento chave o recebimento de “nomes fictícios” na língua indígena.
Esse cronograma de atividades foi elaborado com o objetivo de oferecer aos estudantes uma vivência in situ de aspectos importantes da vida social da comunidade e ao mesmo tempo ter contato com a abordagem antropológica e biológica do tema geral do curso: a relação entre povos indígenas e conservação ambiental.
Continua em breve...
Entre os dias 17 e 31 de julho de 2010, viajei para o sudeste do Pará para participar como instrutor de um curso de campo sobre a interface entre povos indígenas e conservação ambiental. A iniciativa é resultado de uma parceria entre a Universidade de Maryland, a Universidade de Brasília, a Associação Floresta Protegida (AFP) e a Fundação Nacional do Índio (FUNAI). A minha primeira experiência com o curso ocorreu em 2008, quando participei como estudante da UNB. Já neste ano, a minha inserção se deu na condição de “colaborador” da AFP, ONG que representa 9 aldeias Kayapó localizadas na TI Kayapó. Para saber informações mais detalhadas sobre o histórico e os objetivos do curso, ver na página deste blog (que tem o mesmo título desta postagem).
A minha jornada teve início no dia 17, em Brasília, quando embarquei num vôo em direção à cidade de Marabá, localizada na região sudeste do Pará, na companhia dos dois estudantes da UNB que participaram do curso e Maria Beatriz Ribeiro, instrutora da área de ecologia. Ao chegar nessa cidade, cuja povoação teve início ao final do século XIX, notei que a grande nuvem de poeira que paira sobre a região é mais um dos sinais do ritmo frenético de crescimento que esta cidade tem enfrentado nos últimos 15 anos, além das máquinas e canteiros de obras que se espalham por toda parte.
Ao desembarcar no aeroporto, encontramos o grupo de estudantes norte-americanos e a outra instrutora do módulo da aldeia A’Ukre, a antropóloga Laura Zanotti. Ao entrar no ônibus, a expressão do grupo apontava para o extremo cansaço após 9 horas de deslocamento entre Belém e Marabá. Dali seguimos viagem até Tucumã, pequena cidade localizada mais ao sul, onde encontramos o quarto instrutor do curso, o ecólogo Adriano Jerozolimskie, que também exerce a função de coordenador da AFP. O percurso até lá foi um pouco conturbado devido à péssima qualidade das estradas. Lembro que, em 2008, quando estive na região pela primeira vez, o mesmo trecho rodoviário estava em melhores condições, o que indica a má qualidade do asfalto usado na pavimentação da estrada, que até pouco tempo atrás era de terra batida.
Ficamos em Tucumã somente até a manha do dia 19, quando partimos em quatro pequenos aviões em direção à aldeia A’Ukre, localizada na TI Kayapó. Durante esse breve período, aproveitamos para nos conhecermos melhor, fazer a última compra de mantimentos e finalizar a organização do cronograma de atividades que seriam realizadas tanto na aldeia como na base científica do Pinkaiti. A maior parte dos nossos mantimentos tinha sido enviada via barco alguns dias antes e estava a nossa espera na aldeia.
A viagem até a A’Ukre foi uma experiência incrível. Sobrevoamos a TI Kayapó até chegarmos à aldeia. O vôo foi maravilhoso. Como esse tipo de aeronave voa em menor altitude e o céu estava claro, foi possível observar a zona de transição entre o Cerrado e a Floresta Tropical, uma das regiões mais lindas da Amazônia. Na medida em que nos aproximamos da aldeia, o tapete verde abaixo de nós foi assumindo proporção exuberante, revelando que estávamos entrando na terra indígena dos Kayapó, uma gigantesca “ilha verde” que resiste ao avanço do chamado arco do desmatamento.
A chegada na A’Ukre foi repleta de alegria. Ao descer do avião, recebi as boas vindas de Begoti (Tiago), jovem liderança Kayapó (em torno de 40 anos) que conheci em 2008, durante a viagem que fizemos pelo rio Xingu, ocasião em que visitamos outras duas aldeias Kayapó (Kokraimoro e Pukararânkre). Tanto ele como os demais indígenas que estavam nos aguardando na pista de avião da aldeia pareciam felizes ao nos ver ali.
Neste primeiro dia na aldeia, almoçamos e aproveitamos o restante da tarde para tomar banho no rio Fresco, um dos inúmeros afluentes do rio Xingu. No final do dia, nos reunimos na Casa dos Guerreiros, localizada ao centro da aldeia, com os dois caciques da A’Ukre e seus respectivos grupos políticos. Após as devidas apresentações, Adriano falou sobre o carregamento de miçangas adquirido – por vontade e decisão direta da comunidade – com a taxa comunitária paga por cada estudante norte-americano (U$ 400,00): nada mais, nada menos do que 150 kg de miçangas que seriam usadas logo após a nossa saída da aldeia numa cerimônia de nomeação, um dos momentos mais importantes da vida ritual Kayapó. Também discutimos com a comunidade quais os instrutores indígenas que participariam do curso neste ano, além de esclarecimentos sobre a sua remuneração.
Ainda quando estávamos em Tucumã, decidimos dividir os estudantes (8 norte-americanos e 2 brasileiros) em dois grupos: o primeiro grupo ficaria na aldeia, enquanto o outro permaneceria na base científica de Pinkaiti, com previsão de troca no dia 24, sendo que o retorno do “grupo b” estava previsto para o dia 28, com previsão de retorno para Tucumã na manha do dia 30. Eu e Laura Zanotti ficamos responsáveis por conduzir as atividades na aldeia, enquanto Adriano e Fabiana (ambos responsáveis pelo tópico de conservação ambiental) ficaram locados na base científica.
Nos dias seguintes, ambos os grupos vivenciaram o mesmo ciclo de atividades na aldeia: oficina de etnografia e anotações de campo; visita às roças para apreender sobre o trabalho e a variedade de espécies agrícolas cultivada pelos Kayapó; pintura corporal; conversa com os caciques sobre a política aldeã; caminhadas na aldeia para apreender a distribuição do espaço sociopolítico e sua organização comunitária; trilhas na companhia dos instrutores indígenas; discussão sobre os serviços de educação e saúde na aldeia; direitos de imagem; a problemática da regulamentação jurídico-governamental do “acesso” aos “conhecimentos tradicionais associados” ao “patrimônio genético”; consentimento informado, repartição de benefícios e direitos indígenas. Todas essas atividades foram seguidas de seminários de discussão e leitura realizados à noite. Já durante a permanência na base científica, cada um dos grupos fez diversas trilhas no meio da mata para identificação dos diferentes tipos de paisagem; visitou uma cachoeira; fez trilhas e saiu para pescar com os instrutores indígenas e não-indígenas; realizou seminários sobre temas relacionados à conservação ambiental na região; e assistiu documentários sobre povos indígenas. Durante o período que os estudantes permaneceram em Pinkaiti, eles tiveram a companhia constante de 8 instrutores indígenas e retornaram para a aldeia com um pequeno vocabulário em língua Kayapó, que depois tentaram colocar em prática durante o seu período na aldeia. Além das atividades previstas no cronograma oficial do curso, costumávamos receber visitas constantes dos kayapós de manha, de tarde e a noite, além dos estudantes terem participado de momentos mais informais da vida comunitária: banhos de rio no final da tarde, jogos de futebol, festa e pesca. Já no segundo dia de permanência na aldeia, todos os estudantes tiveram os seus corpos pintados com jenipapo, dando início a um processo de imersão na vida comunitária que teve como momento chave o recebimento de “nomes fictícios” na língua indígena.
Esse cronograma de atividades foi elaborado com o objetivo de oferecer aos estudantes uma vivência in situ de aspectos importantes da vida social da comunidade e ao mesmo tempo ter contato com a abordagem antropológica e biológica do tema geral do curso: a relação entre povos indígenas e conservação ambiental.
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