sábado, 30 de junho de 2012

Lançamento do Livro "Redes Sociotécnicas na Amazônia" - 28ª RBA

Gostaria de convidar a todos para o lançamento do livro "Redes Sociotécnicas na Amazônia: tradução de saberes no campo da biodiversidade" (RJ: Edit. Multifoco, 2012), no âmbito da sessão de lançamento da 28ª Reunião Brasileira de Antropologia, a ser realizada na PUC, em São Paulo, entre os dias 02 e 05 de julho. Trata-se de uma versão reduzida e revisada da minha tese de doutorado em antropologia, defendida na Universidade de Brasília, em agosto de 2011. Segue abaixo uma breve apresentação do livro, que pode ser adquirido na:

Editora Multifoco: http://www.editoramultifoco.com.br/literatura-loja-detalhe.php?idLivro=903&idProduto=931

Editora Cultura: http://www.livrariacultura.com.br/scripts/resenha/resenha.asp?nitem=30182015&sid=1061682361499503092058911

 "Este livro resulta do projeto de colocar em relação duas áreas do conhecimento antropológico: os estudos da ciência e a etnologia de povos amazônicos. Trata-se de um estudo de antropologia simétrica voltado para a descrição etnográfica de redes sociotécnicas formadas em torno de iniciativas de 'desenvolvimento sustentável' envolvendo, de um lado, comunidades indígenas e tradicionais e, do outro, pesquisadores das áreas de ecologia, agronomia e farmacologia. ¨Tendo como referência a Teoria Ator-Rede, busca-se analisar a relação entre saberes no campo da biodiversidade a partir de uma abordagem ontológica das práticas de conhecimento agenciadas por cientistas, índios e ribeirinhos na concepção dos 'objetos' que circulam nas redes. Esse tema é analisado dentro do contexto histórico marcado pela regulamentação do acesso ao "patrimônio genético" e ao "conhecimentos tradicionais associados". Durante esse percurso, vamos refletir sobre uma série de temas correlatos, como os direitos intelectuais, as formas de repartição de benefícios, os processos de anuência prévia, os encontros e desencontros entre o naturalismo ocidental e o perspectivismo ameríndio, a emergência da categoria de pesquisadores indígenas, a tentativa de formação de uma farmacopeia ribeirinha e o estabelecimento de uma feira e de uma associação de agricultores indígenas" (Texto Contra-Capa).

"A relação de saberes no campo da biodiversidade faz parte da história de contato entre ocidentais, índios e ribeirinhos na Amazônia. Essa relação foi marcada pela violência e a desapropriação de conhecimentos, mas também deu origem a uma série de iniciativas de colaboração 'intercientífica'. Ao final do século XX, o acesso ao 'patrimônio genético' e aos 'conhecimentos tradicionais associados' passou a ser problematizado do ponto de vista ético e político, resultando em iniciativas de regulamentação jurídica, como é o caso da "Convenção sobre a Diversidade Biológica". Este livro busca analisar pesquisas pautadas pela proposta do 'diálogo' entre a ciência ocidental e outras formas de conhecimento não ocidentais sob o efeito da nova legislação, experiência que nos conduz a uma transposição do Grande Divisor 'Tradição/Modernidade' a partir de uma abordagem ontológica das práticas de conhecimento e tradução agenciadas por pesquisadores e comunidades em iniciativas de desenvolvimento sustentável em andamento na Amazônia" (texto orelha).

"Se existem múltiplas ontologias (mundos), o conflito ou acordo entre elas não depende do estabelecimento de um consenso sobre o que existe 'realmente'. O fundamental é indagar se os efeitos pragmáticos das ontologias de nossos 'parceiros' são bons ou ruins para as nossas atividades de habitação. O fato é que algumas ontologias produzem efeitos que não prejudicam a nossa existência e outras geram fenômenos nefastos em nossas vidas. O fundamental, do ponto de vista metodológico, é que não existe uma essência ou princípio universal que possa servir como base para pensarmos essas disputas. Não existe sujeito neutro, assim como não existe ontologia que não seja contingência histórica. O que resta, portanto, é tentarmos entender os efeitos de nossas ideias em nossas vidas e na vida das pessoas com quem nos relacionamos" (Trecho da Introdução).

"Este livro também pode ser entendido como um conjunto de instrumentos e ferramentas conceituais que podem ser agenciadas novamente a partir da tradução realizada pelo leitor, que vem salvar esses escritos da morte e do esquecimento, para colocá-los novamente em movimento, seja através da reformulação crítica ou da simples reprodução. Isso só é possível quando o livro é pensado enquanto uma caixa de armar, múltiplo, fragmentado, como um mosaico de linhas que apontam caminhos divergentes ou convergentes, mas que precisam ser percorridos pessoalmente pelo leitor, para que possam 'viver' novamente em outros contextos discursivos. Uma multiplicidade que não resulta em pluralidade, permitindo - através dos usos e abusos da leitura - a projeção de uma abertura na ordem do pensamento e da linguagem. Com isso, torna-se inútil qualquer tipo de 'mapa para a leitura', já que o mais importante reside na descoberta que se desdobra no percurso do que propriamente na projeção de um ponto final de chegada" (Trecho da Introdução).

"De um lado, nos vemos diante de questões propriamente analíticas. Como conciliar narrativamente na etnografia, com equilíbrio de proporções, pressupostos ontológicos de/e sistemas de conhecimento que, no mundo da vida, se encontram em relação de dominação / subordinação como soem serem os de pesquisadores em farmacognosia e de especialistas em plantas medicinais de comunidades ribeirinhas? Como seguir as operações de mediação, tradução, transformação e domesticação entre ontologias Baniwa e a ecologia das paisagens, por meio de um conjunto de dispositivos de sistematização e formas de agenciamento, nos marcos de uma pesquisa intercultural colaborativa, sem romantizar os conhecimentos nativos nem sobrevalorizar a capacidade de escuta e tradução dos parceiros não índios?

De outro, Diego se põe também o desafio de fazer o seu trabalho incidir em processos políticos contemporâneos. Como tornar o seu argumento e a sua etnografia de algum modo útil para a revisão do marco regulatório e institucional da proteção aos chamados "conhecimentos tradicionais associados" ao patrimônio genético? Que contribuição o trabalho pode oferecer para potencializar os esforços de pesquisas colaborativas interculturais com orientação simétrica?

Foi nesse duplo registro que li o trabalho de Diego: como, simultaneamente, uma projeção epistemológica ousada e inovadora, e como uma tentativa de intervir em temas quentes e atuais. No primeiro registro, testemunhamos Diego navegar numa malha de fluxos e dispositivos (bioprospecção, farmacognosia, etnofarmacologia, laboratórios, protocolos de pesquisa, circuitos de troca, trilhas, transectos, exsicatas, coleções, fotografias, diários de campo, desenhos, mapas...) e num enxame de atividades e materiais (comunidades ribeirinhas e indígenas, fitoterápicos, plantas medicinais, sementes, manivas, biodiversidade, recursos genéticos, curandeiros, pesquisadores indígenas, roças, paisagens...) guiado por um mapa de conceitos (redes sociotécnicas, ontologias, rizomas) que não necessariamente leva aos mesmos lugares. No segundo registro, percebemos um Diego preocupado em intervir nos debates atuais sobre: propriedade intelectual; consentimento livre e informado; repartição de benefícios do acesso à biodiversidade e aos conhecimentos tradicionais associados; e com a formulação de acordos pragmáticos que enfrentem os dilemas do diálogo intercientífico, criando condições de convivência entre distintas ontologias. É nesse emaranhado de linhas (argumentativas, etnográficas e morais) que Diego e o seu trabalho se interconstituem." (Trecho do Prefácio - Henyio Trindade Barreto Filho).    

sexta-feira, 29 de junho de 2012

Apresentação de Trabalho no GT 17 da 28ª Reunião Brasileira de Antropologia

Entre os dias 02 e 05 de julho, vou participar do GT nº 17 - "Como re-conhecer os impasses do desenvolvimento e do ambientalismo", coordenado por Marta Amoroso (USP) e Stelio Marras (USP) - no âmbito da 28ª Reunião Brasileira de Antropologia, a ser realizada na PUC, em São Paulo. Vou apresentar o trabalho "Redes Sociotécnicas, Práticas de Conhecimento e Ontologias na Amazônia", uma síntese de reflexões desenvolvidas com maior densidade no livro "Redes Sociotécnicas na Amazônia: tradução de saberes no campo da biodiversidade" (versão reduzida e revisada da minha tese de doutorado em antropologia), que também será lançado durante o evento (mais sobre isso em breve).

Segue abaixo o texto de divulgação e a programação completa do GT.

"Pretende-se reunir pesquisas dos mais variados contextos etnográficos que descrevam modos de composição do mundo, mas sem valer-se dos conceitos prematuramente formados de Natureza e Sociedade. A visada simétrica busca evitar tanto a projeção naturalista quanto a relativista nas descrições etnográficas. Os efeitos dessa antropologia simétrica apontam para a renovação do empreendimento comparativo, de maneira a transformar a imagem do ocidental e do não-ocidental, identidade e alteridade. Não se trata mais de partir dos pressupostos estáveis no mononaturalismo (e da sua contraface multiculturalista), mas sim de re-conhecer os fenômenos tal como são compostos ou coletados pelos grupos,  cujas diferenças matriciais não impedem intercâmbios e reapropriações cada vez mais crescentes, entretanto carentes de reflexões refinadas. A crítica antropológica à razão naturalista ocidental que opõe conceitualmente natureza e sociedade (Latour 1991; Descola 1996; Viveiros de Castro 1996) vem propor uma qualificação dos coletivos e suas redes que levem em conta os mais heterogêneos agentes: humanos, entidades, tecnologias. Buscando evidenciar os regimes de relação dos povos indígenas com o meio ambiente, com a sociedade e grupos envolventes, trata-se de uma proposta interdisciplinar que aproxima etnologia, biologia, ecologia política e science studies em busca de alternativas críticas que reflitam sobre o ambientalismo e os impasses do desenvolvimento da cena contemporânea".

Programação do GT 17/28º RBA

03 de julho, Terça-feira

1ª Sessão: Teorias Indígenas e Tradicionais
Local: Sala 43, 2º andar, Prédio Novo (PUC/SP)
Horário: 08-12hrs

Aldeias Guarani Mbya: questões sobre o 'tekoa' e as relações que o formam
Fabio Nogueira da Silva (USP)

Animais e outros seres criáveis: sobre a classificação de organismos vivos entre os Awá-Guajá
Uirá Garcia (UNICAMP)

Entre os yóopinais e a escola. Doenças e indiferenciação na escola Baniwa e Corripaco Pamáali
João Vianna (UFAM) e Luiza Garnelo (ILMD/FIOCRUZ)

Fundamentos orgânicos do saber
Joana Cabral de Oliveira (USP)

O lugar das relações: percepções e posições sobre o 'ambiente'
Priscila Matta (USP)

2ª Sessão: Ambientalismo e Desenvolvimento: controvérsias
Local: Sala 44, 2º andar, Prédio Novo (PUC/SP)
Horário: 08-12hrs

A construção da paisagem pelos Potiguara: do habitar cotidiano à ecologia política
Thiago Cardoso (EntreAmbientes) e Isabel Modercin (UEFS)

Componiendo territorios controvertidos: la instalación de una empresa minera em Wirikuta
Maria Lamberti (Colmex)

Entre as áreas do parque há um Caminho: reflexões sobre um conflito socioambiental em Vitória-ES
Márcio Faria de Freitas (UFES) e Celeste Ciccarone (UFES)

Traduções baniwa da natureza e do meio ambiente em projetos de piscicultura e manejo da pesca
Milena Estorniolo (USP)

Uso e conservação da biodiversidade - entre pressupostos científicos e estratégias de ação
Silva Junior (UNICAMP)

04 de julho, Quarta-Feira

3ª Sessão: Desafios de uma antropologia simétrica
Local: Sala 41, 2º andar, Prédio Novo (PUC/SP)
Horário: 08-12hrs

A onça e o gado: cartografia de uma controvérsia ambiental
Felipe Süssekind (UFRJ)

Natureza, meio ambiente e crise climática: elementos de lutas classificatórias e de distinção social
Gabriel Madureira (UFsCar)

Naturezas esfumaçadas: os Tembé e o mercado de crédito de carbono
Rodrigo Gomes Lobo (USP)

Redes Sociotécnicas, Práticas de Conhecimento e Ontologias na Amazônia
Diego Soares da Silveira (UFU)

Uma análise das representações contemporâneas de natureza na categoria Produto Orgânico
Camila Moreira (UNICAMP)

05 de julho, Quinta-Feira

4ª Sessão: Teorias Indígenas e Tradicionais II
Local: Sala 37, 2º andar, Prédio Novo (PUC/SP)
Horário: 08-12hrs

O terceiro saber: a sinergia entre conhecimento científico e saberes tradicionais
Nelissa Peralta (IDSM) e Deborah Lima (UFMG)

O território em movimento na vila de pescadores da Barra de Ararapira, Ilha do Superagüi (PR)
Juliana Bazzo

Osikirip: explorações Karitiana em torno do "louco", do "especial"
Íris Araújo (USP)

Percepções do ambiente em um quilombo: o conceito de natureza de Mel da Pedreira, Amapá
Angela Steward (IDSM)

Pessoa, hichis e animais para os Chiquitano no Brasil
Verone Cristina da Silva (USP)

Os resumos e trabalhos completos podem ser encontrados no link:
http://sistemasmart.tempsite.ws/rba/

sexta-feira, 22 de junho de 2012

A Rio+20 e a Cúpula dos Povos

Em 1992, quando foi realizado a "Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento", conhecida popularmente como "Eco-92", as noções de 'desenvolvimento sustentável' e 'crise climática', apesar de estarem sob debate desde a década de 1970, eram conhecidas por um seleto grupo de 'especialistas' e 'ativistas' ligados ao movimento ambientalista. Na época, ainda havia uma série de controvérsias científicas em torno da magnitude e das razões do aquecimento global, gerando incerteza e ao mesmo tempo constituindo um espaço de agenciamento governamental dos saberes dos cientistas na luta política e nas batalhas diplomáticas. Apesar das dificuldades, no entanto, foram firmados documentos internacionais importantes, como a Convenção sobre a Diversidade Biológica (CDB) e a Agenda 21, abordando assuntos como a regulamentação do acesso ao patrimônio genético e aos conhecimentos tradicionais, mudança climática, recursos hídricos e segurança alimentar.

Duas décadas depois, o cenário político internacional mudou consideravelmente e a temática do 'desenvolvimento sustentável' se tornou popular entre amplos setores da sociedade civil, dando origem a uma rede de extensão global que envolve um conjunto heterogêneo de organizações civis e governamentais mobilizadas em torno de uma diversidade de projetos e iniciativas. A ideia de 'crise ambiental' foi disseminada amplamente pelos meios de comunicação, através de uma abordagem sensacionalista das catástrofes climáticas. A 'economia verde', por outro lado, foi transformada no novo eldorado do capitalismo internacional com a organização de todo um mercado em torno dessa nova modalidade econômica. Essas 'caixas-pretas' são constantemente abertas, reformuladas, desconstruídas, reformuladas e fechadas novamente, voltando logo depois a reproduzir o mesmo movimento de tradução. Enquanto as controvérsias circulam, elas também se transformam. Independentemente do posicionamento político diante das disputas, havia certa expectativa mais ou menos compartilhada que o evento resultaria na fabricação de novos dispositivos governamentais.  

Mas o resultado das discussões entre diplomatas, burocratas e líderes governamentais, ficou aquém do esperado. O documento é vago, não trata de questões polêmicas e transfere para o futuro o estabelecimento de acordos mais contundentes em torno de compromissos políticos efetivos com o 'desenvolvimento sustentável'. Mais preocupados em calcular com precisão o 'valor econômico' da biodiversidade, os governos buscam mercantilizar e contabilizar o meio ambiente como uma fonte de lucro e não de vida. Com isso, a Rio+20 tornou-se uma espécie de 'mega-show pirotécnico', com muito alarde mas sem efetivar nada de concreto. Preocupados em calcular o preço final da destruição em massa, a definição de 'quem vai pagar a conta' acabou assumindo uma prioridade diante do estabelecimento de metas e compromissos em torno de iniciativas governamentais com efeito prático na vida das pessoas. Nesse processo, a vida é mercantilizada e esquadrinhada na forma de tabelas, gráficos, índices estatísticos e cálculos de contabilidade. Toda uma 'economia do risco' e da 'probabilidade' surge daí, com sua conversão de pessoas em números e de sonhos em possibilidades matemáticas. Masentre a teoria e a prática existe todo um oceano a ser navegado, entre o mapa e a vida existe todo um 'mundo' a ser desdobrado... Como nos diz Bateson, 'o mapa não é o território'...

Salva-se, como sempre, o evento paralelo, organizado por diferentes setores da sociedade civil, que buscam pressionar os governantes a assumir a sua responsabilidade diante da crise ambiental. A 'Cúpula dos Povos' reflete a angústia da sociedade diante do imobilismo dos representantes políticos. Pena que esse movimento de crítica à mercantilização da vida humana e não humana não consiga romper com os muros do Rio Centro. Entre os governos reunidos nas salas climatizadas e o povo que ocupa as ruas da cidade, organizando-se em coletivos mobilizados em torno do valor da vida, existe uma distância quase intransponível entre dois mundos (ou ontologias) completamente diferentes: de um lado, o 'mundo da vida'; do outro, o 'mundo da economia política'. A linguagem conceitual utilizada pelos burocratas - baseada na noção de 'população' como um objeto governamental e na lógica da soberania política e da competição internacional - não corresponde a linguagem dos povos, voltada para a manutenção dos meios fundamentais para a continuidade da vida na terra. Entre esses dois universos conceituais, existe todo um caminho repleto de obstáculos a ser percorrido e a tarefa exige esforços de ambas as partes. 


E as 'vozes subalternas', para usar uma expressão cunhada por Foucault, estão disseminadas por toda parte, ocupando espaços inusitados, convertendo o sentimento de angústia em um grito de luta, que ressoa também nos gabinetes governamentais. O povo nas ruas exige atitude, compromisso e ação concreta dos representantes políticos, que insistem em colocar a contabilidade acima de todos os demais saberes. O que vemos claramente a partir desse 'evento crítico' é a explicitação de uma crise da democracia ocidental, marcada por uma falência dos dispositivos de 'representatividade', a partir do estabelecimento de uma distância entre o que determina a vontade popular e o que estabelece a decisão dos governantes. Enquanto os países desenvolvidos e em desenvolvimento investem bilhões na busca de uma solução para a crise financeira internacional, transferindo grande parte de suas economias para os bancos e fundos financeiros, recusam-se a fazer o mesmo em relação ao meio ambiente e a vida.  


Talvez estejamos próximos de repetir na vida a cena retratada no livro de Saramago, "Ensaio sobre a Lucidez", quando os cidadãos resolvem, inesperadamente, dar um basta no 'circo democrático' votando em branco nas eleições. 

quarta-feira, 6 de junho de 2012

Senado aprova criação de 20 mil cargos para professor de nível superior

No último dia 30 de maio, o plenário do Senado aprovou o projeto de lei nº 36 de 2012, que prevê a criação de 20 mil cargos de professor de nível superior. A notícia foi bem recebida pelos professores, pois está associada a uma das principais demandas do atual movimento grevista, que luta também pela melhoria das condições de trabalho e infra-estrutura universitária, principalmente, diante da política de expansão das vagas e cursos nas universidades federais. A maior parte desses cargos visam o preenchimento de vagas em cursos e universidades recém criadas no âmbito do REUNI. Resta agora observar de perto como essas vagas serão distribuídas...

O projeto agora deve ser aprovado pela presidenta, que enfrenta uma greve docente em nível nacional.      

segunda-feira, 4 de junho de 2012

O Salário dos Docentes das Universidades Federais

Em um contexto de greve dos docentes das universidades federais é importante refletirmos sobre a situação salarial dos professores, tendo em vista que esta é uma das demandas do movimento grevista. Atualmente, o salário de um professor de início de carreira com graduação (categoria 'auxiliar'), com regime de dedicação exclusiva (DE), correspondente ao menor nível salarial da categoria, é de R$ 2.762,36. Já um professor de início de carreira com doutorado (categoria 'adjunto'), com DE, é de R$ 7.333,67. E por fim, o maior nível remuneratório, corresponde ao professor com doutorado (DE), nível associado IV, chega a R$ 11.755,05. Esses valores são referentes ao vencimento básico + GEMAS + Retribuição por Titulação (RT).

Para termos uma ideia aproximada do quanto esses salários estão defasados, basta compararmos esse valor com o salário de alguns cargos federais:

Oficial de Inteligência da ABIN: R$ 12.960,86 (nível remuneratório inicial) - R$ 18.400,00 (final)
Defensor Público da União / Procurador Federal: R$ 14.970,60 (inicial) - 19.451,00 (final)
Auditor da Receita Federal: Idem.
Diplomata: R$ 12.962,12 - R$ 18.478,45
Pesquisador/Analista do Ministério da Ciência e Tecnologia: R$ 8.146,87 - R$ 12.786,32
Advogado do Senado: R$ 23.826,57 (inicial)
Analista / Técnico do Legislativo: R$ 18.440,64 (inicial)
Auxiliar Legislativo: R$ 10.241,36
Juízes Federais: R$ 22.911,74 (nível inicial)
Deputado Federal: R$ 26.763,13 (inicial) + R$ 60.000,00 (Verba Adicional)
Deputado Estadual: R$ 12.500,00 (inicial) + Verba Adicional
Presidente da República: R$ 26.700,00

Como podemos ver na listagem acima, o salário atual dos professores das universidades federais está bem abaixo da média salarial de outros cargos federais, com destaque especial para os cargos de auxiliar legislativo e oficial da ABIN (pois ambos exigem o nível de graduação para ingresso na carreira) e para analista do MCT (com nível de doutorado, mas com remuneração bem superior aos professores com mesmo nível educacional). Essa disparidade salarial reflete o espaço secundário que a educação sempre recebeu na agenda política do governo federal. Tendo em vista que um professor com nível de doutorado investe no mínimo 12 anos em formação acadêmica (graduação + mestrado + doutorado), na maior parte das vezes contando com auxílio do governo federal (bolsas etc.), o seu salário inicial não deveria estar abaixo do salário de um analista do legislativo (com nível de graduação).

Além do mais, não podemos deixar de avaliar a importância da função associada ao cargo, pois um docente de nível superior é responsável pela formação de milhares de pessoas durante a sua carreira. E olha que estamos falando do salário dos professores de 3º grau... Pois os professores de nível básico e médio recebem um salário mais miserável ainda.

Mas a maior indignação surge quando vemos o quanto o governo federal gasta por mês com cada senador:

Salário: R$ 26.723,13
Auxílio Moradia: R$ 3.750,00
Verba Indenizatória + Passagens: R$ 21.000,00 (inicial), podendo chegar a R$ R$ 44 mil.
Verba de Gabinete: R$ 80 mil

TOTAL: R$ 131.473,13 (X 81 = R$ 10 milhões por mês, sem falar nos senadores aposentados...)

Mesmo diante de gastos tão altos, o senado aprovou recentemente um aumento do salário dos senadores em nada menos do que 61,8%! Por outro lado, a demanda dos professores por um aumento de 14% no vencimento básico é tratada pelo governo federal como 'incoerente' diante do contexto de crise financeira internacional... Estamos diante da velha história: 'dois pesos, duas medidas'...  

Como diria o Professor Raimundo, 'enquanto isso, o nosso salário ó'....

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