A região do Mato Grosso do Sul tem sido cenário de ações violentas contra os povos indígenas, que enfrentam diariamente um contexto regional extremamente hostil. Essa hostilidade está presente, obviamente, em assassinatos e crimes, mas também predomina de forma dissimulada entre uma parte da população local não-indígena, que percebe os índios como um obstáculo ao desenvolvimento regional. Essa conjuntura política já gerou diversas situações de conflito aberto entre, de um lado, latifundiários, fazendeiros e comerciantes; do outro, índios das etnias Guarani-Kaiowá e Guarani-Nãndeva, que lutam pelo reconhecimento dos seus direitos territoriais. Nas últimas décadas, essas etnias têm conseguido certo avanço (ainda modesto) na recuperação dos seus territórios tradicionais, denominados de tekoha, áreas de onde foram expulsos nos últimos séculos de colonização. Esse processo foi acompanhado por uma intensificação do avanço das frentes desenvolvimentistas regionais, representadas pelos empresários do agronegócio e uma estrutura governamental que trata os índios com omissão e descaso. O conflito agrário tem se agravado bastante nos últimos anos.
No dia 18 de novembro, sexta-feira passada, o acampamento Guaviry, de índios da etnia Kaiowá, foi atacado por um grupo de 30 pistoleiros fortemente armados. Na ocasião, o líder indígena do acampamento, o cacique Nísio Gomes, foi brutalmente assassinado na frente de seus familiares, num ato de violência covarde. Até o momento, quatro jovens que estavam no local estão desaparecidos, outros foram feridos na fuga e a comunidade como um todo encontra-se em estado de pânico e trauma profundo. Algumas pessoas, com medo de novos ataques, ainda estão escondidas na mata. O grupo aguarda o lento processo de reconhecimento de suas terras. O acampamento foi montado em um trecho de terra localizado entre as fazendas Chimarrão, Querência Nativa e Ouro Verde, todas elas instaladas em área de ocupação tradicional indígena. O território está em fase final de reconhecimento pela FUNAI e os índios estão sendo ameaçados pelos fazendeiros e seus mandantes. A situação é de extrema tensão e conflito iminente. Recentemente, um grupo de 70 índios da mesma etnia se dirigiu ao local para defender e apoiar seus companheiros.
Esse evento é o reflexo de um contexto mais amplo de constantes ataques aos direitos indígenas na região, algo que já era de conhecimento da presidência da república há um bom tempo. Inclusive, a visita de uma comissão de direitos humanos estava prevista para ocorrer nos próximos meses e, diante do acontecimento, acabou sendo antecipada. O assassinato de lideranças indígenas é uma ação terrorista que não pode ser permitida pelo Estado, que deve agir de forma contundente na busca dos culpados e mandantes. Diante da omissão (e, em algumas situações, conivência) do poder público estadual frente à violência cometida contra índios que lutam pelo reconhecimento dos seus diretos constitucionais, cabe ao governo federal investigar, prender e condenar os assassinos. A situação fundiária na região merece uma atenção especial do poder público em suas diferentes instâncias (ministério público, polícia militar e civil, secretarias estaduais, ministérios federais etc.), visando uma ação conjunta e coordenada para superar a tensão e os conflitos entre índios e não-índios. Essas ações devem ser de caráter permanente, através de um acompanhamento constante dos conflitos na região.
O Estado não pode ser conivente com o terrorismo e deve agir em defesa dos direitos indígenas, criando as condições para que esses direitos sejam exercidos na prática. Para isso, é fundamental intensificar a velocidade dos estudos e do processo de reconhecimento de terras indígenas em Mato Grosso do Sul, fornecendo também mecanismos e meios para que esses povos possam viver de forma sustentável, conforme seus costumes e sua cultura.
Um comentário:
É terrível o que estão fazendo com os índios no mato grosso do sul... Temos mesmo que denunciar!
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